segunda-feira, 10 de maio de 2021

 



A primeira versão da casa, quando ainda não havia irregularidades.

Associativismo

UM  DRAMA CAMPESTRE TOMARENSE 

Consta, lê-se, subentende-se, interpreta-se. Há um problema grave, ali para os lados do Carrascal. Dos antecedentes extrai-se que, quando alguém entra na política pelo telhado, e tem a sorte de vencer, tende depois a abusar, da sorte e da confiança alheia.
Durante os primeiros anos, um fiel escudeiro -homem do norte, homem honesto, homem trabalhador- tudo aturou e continuou a apoiar. Até mesmo arredar ilegalmente quem ele julgava que podia prejudicar o seu ídolo e senhor. Os anos passaram, foi-se a fortuna mas ficaram os hábitos, sobretudo os maus hábitos.
O fiel escudeiro foi fazendo como o escravo Jau, que pertencia a Camões e para ele foi pedindo nas ruas de Lisboa. Quando finalmente achou que já bastava, o fiel escudeiro terá tentado obter o impossível. Até hoje não há notícia de que algum leão se tenha tornado vegetariano. 
Desiludido e arrependido, o fiel escudeiro atirou com o escudo, demitiu-se das modestas funções que exercia, e procurou denunciar por meias palavras na informação local. Sem grande sucesso, há que reconhecer.
Os restantes interessados mantiveram uma prudente expetativa. Vergonha, medo de represálias,  falta de hábito, ignorância, todos se vão abstendo o melhor que podem e sabem, sempre com a esperança de que apareça alguém capaz de resolver o problema, sem causar demasiados estragos colaterais. Entretanto a corrupção continua, ao que consta.
Os esquemas são, ao que dizem, bem conhecidos. Em Tomar e por esse país fora. Chamam-se sobrefaturação e necessidades fictícias. No primeiro caso, cobra-se clandestinamente uma percentagem sobre todos os fornecimentos à instituição, o que provoca sempre sobrefaturação, detetável ou encapotada, mas sempre rastreável. Dá é algum trabalho. 
Com o aumento da despesa daí resultante, e sem poder aumentar as receitas na mesma proporção, sucedem-se os chamados "défices de exploração", regra geral cobertos pelo orçamento de Estado,  só quando já não há outro remédio. Por vezes demasiado tarde.
No caso das necessidades fictícias, encomendam-se projetos e pareceres vários, ou fazem-se ajustes diretos, todos muito sumarentos, que no final se revelam praticamente inúteis, pois nunca houve a intenção de que servissem para algo mais, além do sumo respetivo..
Tal como no caso mais geral da autarquia e do país, há duas hipóteses. A mais rápida e eficaz, mas também a mais arriscada, é adotar a posição dos forcados -pegar o touro pelos cornos, logo que possível. No caso, provocar eleições, apresentar lista e vencer. Sem medo de eventuais retaliações, que nem sempre são inevitáveis, pois o corrupto nunca tem o poder nem as capacidades que julga.
A outra saída consiste em ir aguardando que surja um milagre, capaz de resolver tudo sem sangue, nem estragos colaterais. Se a anunciada comissão de trabalhadores se integra de alguma maneira nesta segunda hipótese, não percam mais tempo. Mas não esqueçam o que escreveu Clemenceau, no século passado:"Se querem resolver o problema, força! Caso contrário, nomeiem uma comissão."
É bem sabido, mas não se perde nada ir lembrando, que a corrupção é um cancro, e como tal deve ser tratada. Por conseguinte, quanto mais cedo se retirar o tumor, mais possibilidades há de que não tenham ficado metástases, e a cura seja portanto total.
Com paninhos quentes, à maneira tomarense, é que não vamos a lado nenhum, pois a doença vai-se agravando, até à inevitável morte do paciente.
A Misericórdia de Tomar é uma Santa casa, e mesmo assim as dificuldades são muitas. Agora imagine-se uma entidade que, não sendo santa, não está forçosamente na graça de Deus...

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