sábado, 3 de dezembro de 2022

Vida local 

Um SDF na Rua Amorim Rosa

Publica o Tomar na rede uma local, sobre um homem que costuma dormir numa passagem coberta da Rua Amorim Rosa. Um "sem abrigo", em português, um "sem domicílio fixo", em tradução do francês. Quando cheguei a Paris, nos anos 60 do século passado, fui viver no 5º bairro, o chamado Quartier latin, onde ficava na época a Universidade de Paris, abreviadamente a Sorbonne, que entretanto foi dividida em 12 outras universidades, deixando de existir enquanto tal.

Tendo ficado impressionado, à boa maneira portuguesa, com um grupo de 4 SDF, ou clochards em francês, que dormiam ao relento na minha rua, aproveitando o ar quente proveniente de um respiradouro do Metro, resolvi comprar umas conservas e garrafas de vinho, e levei-lhes pelo Natal. Olharam para mim, algo surpreendidos, e um deles depois de examinar o que eu oferecera, disse num tom neutro: -O vinho podes deixar; o resta leva que te pode via a fazer falta. Foi o que fiz.

Depois disso, corri muito mundo e vi SDF por toda a parte. De Paris a Moscovo, de Nova Iorque a Montreal, de Pequim a Xangai, ou de Estocolmo à Ilha da Páscoa. Conclui que em muitos casos se trata simplesmente de um modo de vida, como outro qualquer. Criticável, é certo, mas aceitável em democracia, ou mesmo nos países comunistas, como a China. 

Em Washington, onde fica o cemitério militar nacional de Arlington, são aos milhares, praticamente todos antigos combatentes das sucessivas campanhas levadas a cabo pelos americanos. 2ª Guerra mundial, Coreia, Vietnam, Iraque, Afeganistão...

Os franceses assim o entendem, e tratam os seus SDF como cidadãos. Todas as semanas recolhem esses SDF em Paris (excepto os consumidores de drogas duras, que têm outros procedimentos) nos famosos "panniers à salade", e levam-nos para um centro de assistência. Aí tomam banho, cortam o cabelo e a barba se assim o entenderem, são examinados por um médico, recebem alguma roupa e calçado, comem uma refeição quente... e regressam aos locais de origem até à semana seguinte.

Como escreve uma comentadora no Tomar na rede, o homem da Amorim Rosa deve ser ajudado, se quiser, mas nestas coisas de gente sem abrigo, nem sempre o que parece é. Basta atentar no que se vai passando em Lisboa, onde sucessivas ONG vão ajudando os SDF, deixando-lhes comida, calçado, roupa e cobertores, que eles logo a seguir vão seleccionando e atirando os excedentes para os contentores.

Ao contrário dos ciganos, ex-nómadas que vindo para Tomar sabiam muito bem ao que vinham, uma vez que logo no início a Câmara não cumpriu a sua obrigação, que era de os obrigar a ir para fora do concelho, após 15 dias de permanência, este sem abrigo ou é mesmo ignorante, ou é da região, ou foi enganado, ou enganou-se. Porque nem mesmo os SDF com alguma experiência querem vir viver na rua em Tomar, cujo clima é dos piores do país, a sul do Mondego, e cuja população não é das mais acolhedoras, embora tente dar a ideia do contrário, por hipocrisia. Se nem mesmo os conterrâneos menos convencionais tratam bem, (e sei bem do que falo...), quanto mais agora os sem abrigo! Palhaçadas.

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