sábado, 15 de outubro de 2022


Executivo municipal

É imoral gastar demasiado em espetáculos em tempo de crise

Somos uma terra católica, num país católico, apesar de haver cada vez menos praticantes. O que significa que temos uma relação complicada com o dinheiro. Desde o início que a igreja de Roma se opõe às práticas financeiras com juro. A única exceção foram os templários, praticamente inventores dos cheques e dos cartões de crédito. Arrecadaram milhões, emprestaram a reis, dominaram vários reinos europeus, mas acabaram decapitados, em sentido próprio e figurado. Estávamos no século XIV (14, mas os menos versados em numeração romana).

Aqui na capital templária, apesar da reforma de 1529, que os transformou em frades de clausura, os descendentes integrados na ordem de Cristo dominaram até 1834, ano em que a reforma de Joaquim António de Aguiar mandou encerrar todos os conventos e nacionalizar todos os bens, grande parte dos quais foram depois vendidos ao desbarato.

Quase 50 anos após Abril e com tal passado, o panorama tomarense não é nada encantador, excepto para quem dele beneficia. Já aqui foram feitas várias críticas ao ambiente de festarola permanente, com custos elevados, justificados com a "promoção de Tomar". Mas para promover o quê? O Convento? Não precisa. Os tabuleiros? Também não precisam. A casa das ratas? Fechou. Três ou quatro restaurantes e umas dezenas de unidades hoteleiras? É demasiado gasto para tão pouco retorno.

A feira de Santa Iria permite observar isso mesmo. Apesar da Câmara ser pouco amiga de prestar contas, sabe-se que quase tudo o que é necessário para o evento é subcontratado, o preço dos terrados terá sido determinado e aprovado não se sabe bem em que condições, mas haverá muita e cara animação. Vamos ter, entre vários outros, dois artistas de renome nacional, para outros tantos espetáculos à borla. Um deles cobra 25 mil euros mais IVA e outro 17.500 euros mais IVA. Pensem o que quiserem, mas para o autor destas linhas é imoral esbanjar assim dinheiro dos contribuintes.

Não está em causa o valor dos artistas, mas o modelo de organização. Devia haver entradas pagas, até para aferir se realmente os contratados valem em Tomar aquilo que custam. Só para um artista e os seus acompanhantes são 25 mil euros por um único espetáculo. Dos 33 mil eleitores inscritos no concelho, quantos ganham 25 mil euros anuais antes de impostos?

Se eu fosse eleito municipal, há duas coisas que procuraria conhecer: 1 - O gasto anual da autarquia com a contratação de artistas para espetáculos gratuitos; 2 - Todos os movimentos bancários de contas pertencentes a membros da atual maioria e seus familiares. Bem sei. São todos gente séria, acima de qualquer suspeita, até prova do contrário. Mas "à mulher de César não lhe basta ser séria; tem de parecê-lo." E francamente, para mim, há aí alguns casos que não me parecem.

Em que me baseio? Entre outros, nos dois roubos do recheio da municipal Estalagem de Santa Iria, um dos quais já com a atual maioria, que nunca foram investigados. Porquê? É assim que agem as pessoas sérias? Colaboram implicitamente com os amigos do alheio, não abrindo inquérito, nem apresentando queixa às autoridades competentes?

Não consigo esquecer-me de três anexins bem conhecidos: "É a ocasião que faz o ladrão"; "Tantas vezes vai o cântaro à fonte, que alguma vez lá fica a asa"; "Fidalguia sem comedoria, é gaita que não assobia."

2 comentários:

  1. Neste caso, a racionalidade da medida está na pretensão de chamar visitantes que depois vêm gastar dinheiro na feira.
    Alegadamente é uma das tais medidas que se paga a ele mesma porque assim os feirantes ficam com verba para pagar as licenças.
    Depois é defendida por aqueles argumentos definitivos, "se faz é porque faz, se não faz é... "; ou "os cães... não sei quê e a caravana... qualquer coisa". Sinceramente neste último argumento nunca percebi se a caravana era a câmara, os munícipes ou os feirantes. Os cães serão os defensores, com unhas e dentes, da política PS?
    Várias questões se levantam, como foi dito no texto, até porque, independentemente dos malabarismos, o dinheiro é da Câmara e como tal pago pelos munícipes, inerentes contribuintes. É pago até pelos surdos que não podem ouvir as maviosas notas musicais dos artistas. Ou pelos entrevados que não se deslocam à festa. Depois fica a questão do critério de seleção dos artistas. Se fosse uma câmara PC havia de parecer a festa do Avante. Assim escolhe-se os sucessos mais fáceis, sem esquecer o apoio à Ucrânia e o insulto ao Putin (muito eficaz).
    Bem vamos falar de política. Se este é o modelo que se pretende para a feira de Santa Iria, mais valia criar uma comissão tipo Festa dos Tabuleiros ou Bons Sons. Tirem a Câmara disto, mesmo que não se livre de ter de entrar com algum.
    Outra questão: para que serve uma autarquia? Para mim a resposta é simples - para apoiar a criação ou mesmo criar, desenvolver e manter infraestruturas.
    De uma forma radical, enquanto houvesse um buraco numa estrada, um jardim sem canteiros (Mouchão?), uma rua sem iluminação, um caixote do lixo não despejado, não havia festa nenhuma.
    E depois apoiar as pessoas, facilitar-lhes a vida. Aqui lembro a preocupação do PSD de compensar a redução do IRS das famílias, sacando verbas de outra maneira. Está à vista que a redução até podia ser maior: anda para aí dinheiro que se farta.

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    1. Já houve, durante vários anos, uma comissão da Feira de Santa Iria, que deixava a animação musical aos cuidados da Rádio Cidade de Tomar. Alegadamente porque se "portaram mal", levaram umas palmadas, foram postos ao canto da sala com orelhas de burro, e outras coisas à antiga. Desde então, quem gere a coisa é o pelouro do turismo e cultura, com abundância de pessoal, mas que subcontrata tudo, de preferência "pronto a inaugurar", que dá muito menos trabalho. Fica muito mais caro? Pois fica, mas há sempre quem paga e é outro asseio. Como na nova tendência "street food", em que nem é preciso lavar pratos. Não é nada típico? Pois não. Mas o que é que isso interessa? Pró que é...

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