sábado, 11 de fevereiro de 2023

 


Leitura de fim de semana

Tomar tal e qual

Os tomarenses em geral, porque estamos numa cidade de gente culturalmente muito acima da média, ou que pelo menos se têm nessa conta, os tomarenses em geral escrevia eu,  conhecem bem a técnica impressionista. Pincelada aqui, outra ali, outra acolá, o pintor vai cobrindo a parede, enquanto o artista pintor vai mostrando como vê o tema do seu quadro, que mais tarde poderá valer milhões. Por conseguinte, uma diferença pequena, separada apenas pela palavra artista, a que convirá acrescentar talento.
Procurando esboçar um panorama nabantino, num pequeno condensado de ocorrências, aí vai a curiosidade deste fim de semana. Um jovem de quinze anos, praticante de skate, resolveu escalar uma composição ferroviária, estacionada sem vigilância na estação de Tomar, por motivos que falta apurar. Sofreu um choque eléctrico, que quase o matou por electrocussão. Foi transportado em helicóptero para Lisboa, em estado muito grave, estando em perigo de vida.
Tendo lido a notícia no Tomar na rede, um comentador habitual foi tão prosaico quanto o habitual: "O jovem de 15 anos subiu para cima do comboio, desculpem lá, já têm idade para prever o perigo. As melhoras." Foi quanto bastou para accionar um outro comentador menos plácido, assim estilo estraga albardas e rompe cilhas: "Subiu para cima? Não terá sido para baixo? És mesmo grunho e o teu namorado continua a cortar os meus comentários. Oh, mon dieu! L'amour..." (Entretanto o Tomar na rede eliminou este último comentário.)
Situação burlesca. Alguém usa com propriedade a língua materna, recorrendo a um pleonasmo em ênfase para melhor explicitar o sentido da frase, e vem logo outro cidadão tentar apoucar pela chacota, sem razão alguma, evocando depois questiúnculas antigas. E recorrendo à língua de Molière, mas também de Rabelais, fora de propósito.  
Lamentável atitude, a denotar ignorância em larga escala. Porque realmente, não havia nem há outra maneira simples de dizer ou escrever o sucedido. O jovem não subiu para o comboio, para dentro do comboio. Subiu para cima do comboio = subiu e ficou em cima do comboio. Poderia escrever-se trepou para cima do comboio, exactamente o que aconteceu, mas muitos não entenderiam. Lá diz o provérbio: "Quem quer bolota, trepa". Como no português e não só, quanto mais acima, menos somos e melhor  se está. Mas dá muito trabalho.


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