segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

 

A antiga catedral de Santa Sofia, em Istambul, agora mesquita com quatro minaretes, para que cada muezin possa chamar os fiéis à oração, no seu ponto cardeal respectivo.

Política local

O sofisma do teimoso

Manda a prudência nunca debater com filósofos, sobretudo quando de facto são civicamente iliberais. Abstenho-me por isso de endereçar este esboço de diatribe a quem quer que seja. Trata-se tão só e apenas de uma reflexão de alguém sem formação filosófica específica, e muito menos académica. 
É sabido que os tomarenses em geral têm de herança uma extraordinária capacidade para sacudir a água do capote. Tanta, que nunca consegui ver nas nas janelas ou varandas capotes a secar. Quando chegam a casa, vão sempre secos e impecáveis. Nada nem ninguém consegue molhá-los. Assim, quando por aqui se procura descrever os paisanos, tal como eles foram e são, a reação é pronta e vasta, mas a desviar: -"Lá esta o gajo a dizer mal dos tomarenses." (Tomarenses e não conterrâneos. Ou seja: o escriba crítico não é nem pode ser tomarense. É um incréu, ou um estrangeirado, ou ambos.) Ou, de uma forma mais elaborada, -"Não seja tão contundente. Critique, mas pela positiva." Assim, tipo regimental, sem qualquer outra argumentação
Foi neste contexto que li a peça de certo pensador local, cujo ponto de partida é afinal um sofisma, para tentar sacudir a água do capote, pelo menos do capote dele, assim paulatinamente. A sua tese é simples. Usando o plural para escamotear, afirma que há críticos demasiado pessimistas, anunciando a decadência e o fim de Tomar, por culpa dos seus habitantes. Excluindo naturalmente quem escreve tais coisas hediondas.
Convém antes de mais esclarecer que nunca me excluí, ou procurei excluir, quando descrevo objectivamente os meus conterrâneos. Limito-me a assinalar que não pensamos da mesma maneira, porque eu aprendi alhures, por esse mundo fora. E daí não chegarmos às mesmas conclusões, conquanto as minhas possam não ser melhores que as deles, ou vice-versa. O que de forma alguma me indispõe com os outros. Eles é que por vezes...
Primeira falha portanto no tal sofisma: Não é verdade que o escriba se exclua dos criticados na sua escrita. De alguma maneira, somos todos culpados. Uns por ação, outros por omissão, outros ainda por ambas. Em termos claros, os eleitores são sempre os responsáveis pela atuação daqueles em quem votaram.  
E depois o que me pareceu ser o essencial. Considerando-se um dos visados, porque eleitor enganado, o sofista teimoso escreve que foi para casa, ver-se ao espelho para melhor raciocinar, tendo chegado à conclusão que realmente pouco vale.
Dedução lógica, procura assim insinuar que os tais críticos demasiado ácidos devem antes de mais ver-se ao espelho com toda a atenção, para depois se reduzirem à sua insignificância, em vez de insistirem em inculcar complexos de culpa nos seus semelhantes.
Tudo aceitável, havendo porém uma questão que parece ter escapado ao sofista teimoso, quando é afinal o âmago do problema: Admitindo em teoria, dando de barato, como por aí se diz, que nem os governantes locais nem os seus eleitores devem ser culpados pela evidente decadência da cidade e do concelho, então quem são os responsáveis? O governo de Lisboa? A União Europeia? As Nações Unidas? O Papa Francisco? O clima? O azar? O Covid 19 outra vez?
Podendo parecer que não, a questão é importante, uma vez que, sem se reconhecer antes que está errado ou não serve, dificilmente se emenda ou muda de caminho. Como vem acontecendo...
Quando se transporta consigo uma vasta tralha académica na área do pensamento, convém escrever sempre com um módico de cautela. Para não se cair naquilo que me acontece com frequência: Quem diz ou escreve sinceramente aquilo que pensa, arrisca-se a ouvir ou ler o que não gosta, sobretudo nos meios menos treinados academicamente. E às vezes, até no melhor pano cai a nódoa.

2 comentários:

  1. Que saudades! Perdi-te por uns tempos e reencontro-te, com prazer, neste teu texto tão cheio de boa razão pelo que dizes e pelo que nas entrelinhas se conclui. Um abraço daqueles do teu Amigo Chico Camejo que já nem capote tem.

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  2. Sempre bem disposto, que é o mais importante. Obrigado pelas amáveis considerações. Por aqui, em Fortaleza - Ceará - Brasil, nem capote se usa. Temos durante todo o ano 25º-30º à beira-mar, e um calçadão de 4 quilómetros para dar à perna.
    Em Julho e Agosto conto estar por aí, apesar dos preços proibitivos da TAP. É como dizem os portuenses Transportes Assim Porra!!! Mas não há outros...

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