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"Carta de Nova Iorque"
"EM NOVA IORQUE, NO DIA EM QUE RECEBI UMA FACTURA DE 43.970 DÓLARES DO MEU CIRURGIÃO"
"Arnaud Leparmentier, correspondente do LE MONDE"
Tradução de António Rebelo
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"Nos Estados Unidos, quando ocorre um problema de saúde e somos beneficiários, como 55% dos americanos, de um seguro privado de saúde (custo médio anual de 21.300 dólares para uma família, em geral pago até 75% pelo patrão), sentimos alguns calafrios, mas somos tratados sem ter de pagar as somas mirobolantes de que se fala por vezes.
Esta crónica não trata do caso das pessoas sem seguro de saúde (um pouco menos de 10% da população, segundo a Kaiser Family Foundation), nem dos beneficiários de um seguro de saúde pago pelo estado, porque são pobres (Medicaid,19,8%), idosos (Medicare 14,2%)) ou militares (1,4%). Menos espectacular e menos trágico, trata-se portanto de um mero "episódio classe média", que permite relatar algumas armadilhas do sistema americano.
UM ACORDO PRÉVIO QUE TARDA
Tudo começou em Maio de 2020. De um momento para o outro passei a sofrer uma forte dor ciática. A dor é intensa, coxeio e o meu médico habitual enviou-me para um especialista no Hospital Monte Sinai. Situado ao sul de Harlem, ao longo do Central Park, tem ares de fortaleza, nestes tempos de COVID19. O diagnóstico é imediato: tem de ser operado, caso contrário a paralisia do pé será irreversível.
Transferem-me logo para um cirurgião, que propõe uma operação urgente, nessa noite, ou então aguardar três dias, até quinta, prazo para realizar os exames preparatórios. Fica então marcado para quinta-feira.
Entretanto vejo o cardiologista na quarta, fazem-me uma IRM e um teste PCR - COVID 19. Do ponto de vista médico, estou pronto... mas falta o seguro, que ainda não deu o seu acordo prévio para a operação.
O secretariado do cirurgião informa-me, ao princípio da tarde de quarta-feira, que a companhia de seguros exige que eu a contacte directamente, para explicar o meu caso.
Em pleno nervosismo, via telefone, começa então um diálogo ubuesco de 45 minutos com as equipas da seguradora. Exponho à minha interlocutora o meu estado médico. Seguindo as instruções do cirurgião, comunico os códigos dos actos cirúrgicos previstos, o NIF do cirurgião e o do hospital. Desligo, consternado por esta longa discussão, que não devia ser comigo. E depois, silêncio.
À noite, vagueio como uma alma penada nas proximidades do hospital, lamentando uma operação que afinal não será feita por falta de seguro. Eis senão quando, o cirurgião convidou-me para o seu consultório, para uma sessão de explicações: o seguro hesita, dá o dito por não dito, e o próprio cirurgião não tem o direito de contactar para reclamar. Volta a examinar-me, diz que a mobilidade do meu pé se degrada e propõe uma intervenção urgente, já esta noite. Este procedimento de urgência, justificado em termos médicos, permite ultrapassar as dúvidas do seguro: nas urgências, a companhia de seguros não tem que dar o seu acordo prévio. Os médicos são soberanos e o posterior pagamento pelo seguro obrigatório.
Assim, em vez de chegar tranquilamente ao hospital na quinta de manhã, apresentei-me nas urgências cerca das 22 horas de quarta-feira. O cirurgião informou da minha entrada, fui rapidamente levado para um quarto e a intervenção cirúrgica vai acontecer na quinta, como previsto.
Continua na próxima mensagem.
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