Durante séculos, Tomar foi capital templária e a grande urbe desta zona do país. Sucessivamente, templários e cavaleiros de Cristo, afinal os mesmos mas com outra designação oficial, souberam engrandecer e ampliar a doação inicial de D. Afonso Henriques, na sequência da tomada de Santarém. O primevo "termo de Ceras" transformou-se pouco a pouco, mercê da sábia administração dos sucessivos mestres da Ordem, num vasto território, que ia até Castelo Branco e Pombal, para norte, até à Golegã para sul. Para o defender edificaram vários castelos, que ainda aí estão, no seu todo ou já só em ruínas. Para a sua exploração agrícola dividiram-no em comendas, que foram depois aforadas pelos seus respectivos beneficiários, os comendadores.
Uma vez que na época os impostos eram pagos em géneros, mandou a Ordem construir moinhos e lagares em todos os seus domínios, aos quais os foreiros eram obrigados a entregar a sua produção. Obrigação que permitia a recolha do então chamado "quinto da Ordem", ou seja os 20% que revertiam para a Ordem de Cristo, no cumprimento do estipulado no respectivo foro. E que deram origem ao contemporâneo vocábulo "quinta", para designar uma propriedade média ou grande.
Em Tomar chegaram até nós os lagares e moinhos da Ordem. Podem ser vistos ali na Levada. Felizmente restaurados. Infelizmente inúteis, por manifesta incompetência de quem nos devia governar a nível local. Neles se processou durante séculos a transformação dos cereais em farinha e da azeitona em azeite. Dali saiu, por conseguinte, o essencial da riqueza que o Infante D. Henrique, entretanto nomeado administrador da Ordem de Cristo, em 1420, usou para iniciar a campanha dos Descobrimentos. Financiados, segundo Zurara, o cronista oficial do Infante, "pela sua fazenda e as rendas da Ordem de Cristo."
A segunda grande machadada na autonomia da Ordem de Cristo, após a inicial, que foi a imposição papal do Infante D. Henrique como seu governador, aconteceu em 1529, já os reis de Portugal eram também mestres da ordem por inerência, depois do então duque de Beja e mestre da Ordem de Cristo, ter sido inesperadamente aclamado rei, como D. Manuel I, no final do século XV.
Em 1529, reinando D. João III, o tomarense António Moniz da Silva, frade Jerónimo que professara em Espanha, adoptara o nome eclesiástico de Frei António de Lisboa, e era confessor do rei, conseguiu do monarca mandato para reformar a Ordem de Cristo. Aprovada essa mudança, comendadores e cavaleiros foram expulsos, iniciou-se a construção do chamado Convento novo (a parte renascença do Convento de Cristo) e começou a formar-se a nova Ordem de Cristo com "20 noviços ignorantes", nas palavras do próprio Frei António.
Sete anos mais tarde, a partir de 1536, o reino de Portugal passou a ter o Tribunal da Santa Inquisição, cuja primeira sede foi em Tomar e no Convento de Cristo, tendo Frei António como seu superior. Sabe-se o que veio a seguir, enquanto durou a temida instituição, que ainda hoje envergonha o catolicismo sincero.
Ordem de frades de cógula, vivendo dos proventos proporcionados pelos bens da desaparecida Ordem dos Cavaleiros de Cristo, a Ordem de Cristo reformada foi decaindo ao longo dos séculos, tendo sido extinta, os seus bens sido nacionalizados, e posteriormente vendidos em hasta pública, a partir de 1834. Restam-nos as construções que ninguém comprou, bem como aquelas que acabaram por retornar à posse pública, por manifesta inaptidão para melhor, como é o caso dos antigos Lagares e moinhos da Ordem de Cristo, depois Lagares del Rei, a partir de D. Manuel I.
Quanto ao multi-secular império do azeite, apanágio da Ordem de Cristo, cujos principais lagares eram em Tomar, eis como estamos em 2016. Até as oliveiras se foram alhures. Grande parte para fogueira. O restante para climas menos agrestes em termos fiscais e outros. Em sentido figurado, claro.
Lagares de azeite na região do Médio Tejo – 2015
Concelho | Nº de lagares |
Abrantes | 11 |
Alcanena | 3 |
Constância | 0 |
Entroncamento | 1 |
Ferreira do Zêzere | 5 |
Mação | 18 |
Ourém | 10 |
Sardoal | 4 |
Sertã | 7 |
Tomar | 8 |
Torres Novas | 7 |
Vila de Rei | 1 |
Vila Nova da Barquinha | 0* |
Total – Médio Tejo | 75 |
Fonte: INE
*Embora não constando dos dados estatísticos do INE, Vila Nova da Barquinha tem a funcionar, pelo menos, do conhecimento do mediotejo.net, o Lagar do Casalinho nas Limeiras, Praia do Ribatejo.
Tabela copiada de um trabalho de José Gaio, a quem agradecemos, para a revista digital da Comunidade intermunicipal do Médio Tejo
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminar