Uma vez que me consideram afrancesado, o que até nem me desagrada, vou aproveitar, tendo como objectivo que os eleitos locais, e as eleitas também, vão aprendendo qualquer coisinha. Sobre comunicação, sobre respeito pelos eleitores, sobre comportamento cidadão.
Há um ano no poder, Emmanuel Macron, presidente da República francesa, confrontado com os problemas de um grande país (evacuação dos ocupantes de terrenos públicos de Notre Dame des Landes, Bloqueio pelos estudantes de várias universidades, Greves sucessivas nos caminhos de ferro, bombardeamento na Síria, imigração...), entendeu dever explicar-se perante o país que o elegeu.
Numa mesma semana, concedeu duas longas entrevistas. Na primeira, feita a partir de uma pequena escola primária de uma aldeia da Normandia, respondeu às questões de um jornalista, durante hora e meia. A seguinte durou perto de três horas, com perguntas de dois jornalistas, representando três órgãos de informação, e teve lugar no Palais de Chaillot, no Trocadero, em Paris.
"Não confundamos os papéis; os senhores são jornalistas entrevistadores, eu sou o presidente da República e devo explicações aos franceses", disse a certa altura o entrevistado, visivelmente agastado com o tom de algumas perguntas. Ora leia as várias opiniões sobre a conversa entre o presidente e os jornalistas, como habitualmente numa peça do jornal "Le Monde", a Bíblia do jornalismo francófono:
"O estilo rugoso da entrevista provoca mais reacções que o seu conteúdo"
"O tom impertinente dos entrevistadores irritou alguns partidários do chefe de Estado e a oposição de direita."
"A forma impõe-se visivelmente sobre o fundo. No rescaldo da conversa de Emmanuel Macron no domingo passado, as reacções não tardaram. O frente a frente tenso e depois agressivo entre os dois jornalistas, Jean-Jacques Bourdin e Edwy Plenel, e o chefe de Estado, suscitou muitos tweet e outras declarações, até esta segunda-feira de manhã. O tom e o carácter menos solene da conversa marcaram para muitos uma viragem na comunicação do Eliseu [palácio presidencial].
Os apoiantes do presidente louvaram, como se esperava, essa inovação. O porta-voz do governo, Christophe Castaner, considerou que "vimos um presidente que sabe encaixar, aceitar a crítica, mas também responder taco a taco quando foi necessário. Aguentou o debate."Richard Ferrand, lider do grupo parlamentar La République en Marche [o partido de Macron], confirma a opinião de Castaner, vendo na prestação de Macron "um exercício inédito, entre entrevista e debate, com uma convicção rara."
"Muita agressividade"
Alguns partidários do chefe de Estado irritaram-se contudo face ao estilo considerado demasiado impertinente dos dois entrevistadores, lamentando que o presidente tenha sido tratado pelo seu nome e apelido. "Os senhores nunca se dirigiram a Emmanuel Macron, chamando-lhe simplesmente Senhor presidente da República", agastou-se a ministra Jacqueline Gourault. Opinião confirmada no tweetter por Sacha Houilé, deputado LRM[partido de Macron] da região de Vienne: "Afinal, mais de duas horas de entrevista, foi para facilitar a exibição dos dois entrevistadores durante a primeira hora ?"
A oposição de direita também não gostou do estilo demasiado agreste. "A forma secundarizou o fundo. O debate não esteve ao nível da função presidencial, houve demasiada agressividade", criticou Annie Genevard, deputada LR do Doubs, na segunda feira de manhã, na rádio Europa 1. O seu colega de bancada Dino Cinieri escreveu no Tweeter que se assistiu a um "combate de galos".
A extrema direita também opinou. A presidente da Frente Nacional, Marine Le Pen, considerou esta segunda feira, na TV France 2, que Macron "mostrou finalmente a sua verdadeira cara", a do "pior da direita" e do "pior da esquerda". Já Gilbert Collard, deputado independente do Gard, lamentou ter-se assistido a "um espectáculo; um combate de boxe oral."
À esquerda, as reacções são mais entusiásticas, saudando uma entrevista sem concessões. "Incrível conversa noticiosa. Não se escutam as respostas, aguardam-se as perguntas", reagiu Jean-Luc Malenchon no domingo à noite, no Tweeter. Benoit Hamon, fundador de Génération S, congratulou-se com tal novidade: "Este formato, seja qual for a opinião sobre este ou aquele jornalista, é bem melhor que os exercícios de boa vontade ou coniventes, a que nos habituou a 5ª República."
Finalmente, Esther Benbassa, senadora EELV [verdes] entusiasmou-se e escreveu na rede social "um grande aplauso para os jornalistas Jean-Jacques Bourdin e Edwy Plenel, graças aos quais esta entrevista foi autêntica."
Sylvia Zappi, Le Monde online, 16/04/2018, às 10H46 de Paris
Tradução e adaptação de António Rebelo UParisVIII
Comentário de Tomar a dianteira
Entretanto, pelas bandas de Tomar, nem o poder instalado considera ter a obrigação de se explicar perante os eleitores, nem o corpo informativo ousa abandonar o confortável conformismo. E a população continua a honrar o dito popular "o calado foi a Lisboa e veio e não pagou nada". Quem tenta mostrar as coisas como elas são, "é demasiado agressivo, critica tudo e só sabe dizer mal". Nem mais nem menos. Por isso estamos cada vez melhor.
Comentário de Tomar a dianteira
Entretanto, pelas bandas de Tomar, nem o poder instalado considera ter a obrigação de se explicar perante os eleitores, nem o corpo informativo ousa abandonar o confortável conformismo. E a população continua a honrar o dito popular "o calado foi a Lisboa e veio e não pagou nada". Quem tenta mostrar as coisas como elas são, "é demasiado agressivo, critica tudo e só sabe dizer mal". Nem mais nem menos. Por isso estamos cada vez melhor.
Numa entrevista nunca me interessou o protagonismo ou agressividade do jornalista. Deste apenas exijo que pergunte O QUE MUITO BEM LHE APETECER,O QUE O POVO QUER QUE SE PERGUNTE, mas que deixe o entrevistado responder até ao fim, agrade-me ou não o que diz. Instaurou-se quase a obrigação (profissional lacaia...) de o entrevistador falar quase tanto como o entrevistado, retirar-lhe o protagonismo (para o que, aliás, foi convidado). Eu não assisto a uma entrevista para ver brilhar o jornalista, para conhecer as opiniões do jornalista, para o ver brigar com o entrevistado. Nas televisões portuguesas é costume os entrevistadores porem-se nos bicos dos pés, monopolizarem o diálogo, interromperem o outro, sobrepondo perguntas para atrapalhar, para serem eles a estrela do momento. Não conheço setor profissional onde os seus membros se odeiem mais uns aos outros, onde a cobardia mais impere, onde o servilismo mais campeie. Sou um fã do futebol (até já o pratiquei),um fervoroso adepto do Benfica e jamais alguém me viu durante toda a minha vida a ler um jornal desportivo, por razões óbvias...
ResponderEliminarEm Portugal os entrevistadores (jornalistas) são quase todos exibicionistas ascorosos. Regra geral são lacaios dos grandes interesses. E compreende-se, a esquerda em Portugal não tem nem jornais nem televisões. Obviamente, não tem dinheiro para isso. E os jornais partidários são fastidiosos até ao enjoo.