domingo, 22 de outubro de 2023



Festa dos tabuleiros

A péssima imagem 
da Comissão central da Festa grande


O problema é antigo, e agravou-se singularmente com as normas da contabilidade pública moderna. A Câmara delega num cidadão, a que chama mordomo, as funções inerentes à realização da Festa dos tabuleiros, garantindo-lhe o respectivo financiamento com dinheiro do orçamento municipal. O mordomo é alegadamente escolhido por 200 ou 300 habitantes, de um concelho de 34 mil eleitores, previamente combinados, que se juntam no salão nobre dos Paços do concelho, e se limitam a levantar o braço quando lhes é dito para o fazerem. 
Tal prática, apresentada como  tradição local, até nas tribos africanas e da América do sul já é contestada, quando vão eleger os chefes. Em Tomar, contudo,  parece estar de pedra e cal, porque se trata na verdade de uma artimanha para delegar num cidadão obediente, e numa comissão privada às ordens, a capacidade para usar o dinheiro dos impostos, assim fugindo às normas oficiais da contratação pública e ludibriando o fisco.
A tramoia é tão óbvia que os próprios envolvidos, quando há críticas a respeito, vêm logo acusar os discordantes de serem contra a festa, quando são apenas adversários do método obsoleto de nomeação do mordomo e do modelo ultrapassado de organização. Apesar disso, até agora, tem ido tudo bem, no melhor dos mundos possíveis, como diria o Pangloss. Os tomarenses em geral parecem gostar assim, se calhar porque não concebem que possa ser de outra maneira, tornada contudo inevitável pela evolução societal.
Segue-se que a tal estrutura, aparentemente liderada pelo mordomo, quando na verdade  quem manda é quem preside à Câmara, como é natural, por ser a única entidade legitimada pelo voto, tem os seus limites. Os tomarenses aguardam há três meses a publicação das contas finais dos tabuleiros 2023, agora anunciadas para o início de Novembro. Na era da informática e do instantâneo, mais de três meses para ultimar as contas de uma manifestação que custou perto de milhão e meio de euros, dá que pensar e provoca comentários pouco amenos e nada abonatórios.
Dá que pensar, porque se os organizadores de uma festa de milhão e meio, necessitam de mais de três meses para apresentar as contas finais, então os responsáveis das Jornadas Mundiais da Juventude, que custaram 50 milhões, deveriam precisar de anos, o que não aconteceu, pois até já estão publicadas.
Situação que desencadeia, no caso tomarense, uma versão segundo a qual, durante os mais de três meses, os intervenientes estiveram a cozinhar os dados contabilísticos disponíveis, de forma a tornar comestíveis algumas despesas, intragáveis de outra forma. É a imagem que paira sobre a urbe, acompanhada de uma nuvem igualmente escura: o custo muito exagerado da edição 2023 da Festa grande, quando comparado com 2019.
Quase um milhão e meio de euros, sem retorno de bilheteira, para pôr na rua 618 tabuleiros, cujos pares portadores não são remunerados, é demasiado dinheiro mal gasto. Só pode! Procurando manter a falta de transparência da comissão central, a presidência da Câmara e o mordomo vão-se desculpando com o aumento geral do custo de vida, argumento que não colhe, quando comparado com a edição anterior da festa.
Em 2019, os 600 mil euros já foram considerados excessivos para a época, tendo-se falado então de esbanjamento. Como justificar agora os custos de 2023, que são mais do dobro, em apenas quatro anos?
Aumento geral do custo de vida? Houve, sim senhor. Mas a inflação nunca chegou sequer aos 10% anuais, quanto mais agora aos 25% que seriam necessários para justificar o aumento da despesa dos tabuleiros 2023, em relação a 2019. Um milhão e quinhentos mil euros, a dividir pelos 618 tabuleiros do cortejo, dá 2.427 euros cada um. Uma enormidade, mesmo numa câmara com tendência para gastar à bruta.
Há portanto algo que terá de ser investigado, porque não bate a bota com a perdigota. Parece haver gente a governar-se à larga com dinheiros públicos, sem respeitar as normas regulamentares em vigor. Será desta que vamos finalmente iniciar a reformulação da organização dos tabuleiros, e a redefinição dos objectivos da festa? Quanto mais tarde, maior poderá vir a ser o escândalo. 
A matilha é cada vez maior, e a cadela não pode com tanto cão.



7 comentários:

  1. Venho propor que seja criada uma lista com os temas criticados e sem resposta /solução para podermos ver a enormidade de coisas merecedoras de crítica e à espera de solução.
    Isto porque vi um vídeo onde de uma forma clara é dito a seguinte evidência que a maioria dos portugueses nem se apercebe:
    O orçamento do estado de 2024 regista uma colecta de impostos diretos e indirectos, mais as taxinhas de 124 mil milhões de euros.
    Se dividirmos esse número por 10 milhões de portugueses dá 12400€ por cada um, crianças, velhos e outros.
    Ou seja o Governo gasta em nome de cada português 12400€ cada ano.
    A pergunta é, os serviços que o Estado nos retribui justificam esse valor?
    Quantas famílias casal com 2 filhos ganham 49600€ por ano.
    Este é o polvo que nos suga.
    Com a CMT é o mesmo à escala do concelho.

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    1. Tendo em conta que cerca de metade da população não paga IRS, por não auferir que chegue, ou por aldrabice, o exagero é ainda mais evidente.
      Tal como os tabuleiros nabantinos, a mais de 2.400 euros cada. Onde já se viu semelhante regabofe?

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    2. Com todo o respeito caro professor, e espero que não me leve a mal, eu estive a analisar as contas de 2019 e 2015, e acho que ainda é cedo para o professor chegar á conclusão que a festa custou 1.3 ou 1.4 milhões aos contribuintes nabantinos. Teremos de esperar pelo balancete, que concordo consigo já devia de ter saído, mas o que é que quer, esta malta não sabe fazer contas!!! A festa de 2019 não custou 600 mil euros, salvo erro foram 550 mil com 270 mil do orçamento da câmara, e com uma quantia que transitou de 2015, salvo erro 17 mil euros. De 2019 para 2023 transitaram cinquenta e tal mil euros. Uma coisa é certa, a festa é deficitária, não sobrevive sem a CMT, o que não é de admirar. Falta apurar o dinheiro que aquelas centenas de milhar de pessoas deixaram em Tomar e os impostos que isso representa. Posso vos dizer que por ano a CMT arrecada pouco mais de 600 mil euros em derrama, salvo erro é 1.5% do lucro das empresas do concelho.

      Eu fiquei todo arrepiado de ouvir a sôtora Anabela Freitas, numa reunião de câmara, dizer que ainda não tinham saído as contas porque faltava apurar o número de horas extraordinárias feitas pelo pessoal da câmara, e foram muitas, e que o pessoal ainda não tinha metido as horas por inclusive alguns se encontrarem de férias. O Professor e os seus leitores pesquisem no Google por contas da festa dos tabuleiros que aparece um site do mirante, salvo erro, ou do médio tejo, já não sei, com esta informação.

      Ora, e eu pergunto, já que os vereadores da oposição não o fizeram: Os trabalhadores da câmara é que controlam as horas???!!! As horas extra não são aprovadas previamente pelos superiores???!!! É á l'regardene???!! Isto é muito grave e vem demonstrar a inaptidão da presidente para a gestão, a chico espertise dela, e a inaptidão dos vereadores PSD que são uns anjinhos, ouvem as balelas dela e não dizem nada. Isto está na net, vão lá ver.

      Também me arrepiou ela vir dizer que o orçamento fazia-se em três vertentes: aquisição de bens, aquisição de serviços e transferências de capital, e que ainda havia hipótese de afinar um destes itens, eu espero que sejam as transferências de capital, e que ainda não divulgavam dados porque podiam aparecer alguma surpresa de última hora!!! E eu fiquei estupefacto com o que li e ouvi. Então ela admite que as contas são marteladas e o pessoal do PSD não diz nada.... um balancete é uma coisa séria e então quando se trata de dinheiro público é MUITO SÉRIO. Pobre Tomar..... (Vão á net e vejam se é mentira!!!)

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    3. Não tenho nada que levar a mal. A crítica deve ser sempre livre. Escrevi cerca de milhão e meio, porque de acordo com os dados oficiais já disponíveis, é por aí que a coisa deve ficar desta vez.
      Sobre as horas extraordinárias dos funcionários municipais, é muito justa e oportuna a sua observação. Convirá no entanto alterar a expressão que usou para "à Lagardère" ou, em bom português chão, "à fartazana". A não ser que o Helder seja monárquico, convindo nesse caso escrever "é fartar vilanagem!".
      Mas nada de falar em ciganices na elaboração das contas ou na gestão municipal, que os ciganos podem ofender-se e a malta da informação não gosta de "individualizar", como eles dizem.

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    4. Eu não sou francófono como o professor, eu sou anglófono. Há uma parte do meu texto onde eu me refiro a orçamento e quero dizer balancete, são coisas diferentes obviamente. Mas acho que a malta percebe o eu escrevo, ao contrário dos economistas encartados, que já saem formartados do ISCTE, ISEG e similares com aquele jargão que dá sono, não dizem nada de jeito e quando dizem algo não vão diretos ao assunto, andam ali ás voltas a adornar o lance e não marcam golo.

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  2. O MP (Manuel Pereira ) que investigue pois foi para isso criado ,mas criado deles sou eu !

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    1. Se não estou enganado, ele faz parte da comissão do bodo

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