segunda-feira, 18 de outubro de 2021

 


Crise tomarense

...e estão-se a ir embora

Há por aí umas criaturas que são especialistas em repetir o que lhes dizem para dizer. São verbos de encher. Sem conteúdo próprio. Segundo essa gente, o autor destas linhas "é só conversa", entre outros mimos tomaristas. Em português de baixo coturno, que calhando nem sabem o que seja. Estão enganados. Nem sequer vêem ou entendem o microcosmo em que vivem, na cova nabantina.
Além das minhas duas carreiras profissionais, no turismo e no ensino, há outro campo que não lhes convém reconhecer. Tenho uma dúzia de pequenos apartamentos, todos em prédios citadinos, recuperados no século passado. Quando ainda não era moda a recuperação do edificado. 
Nessas obras, trabalhei como encarregado geral, mas fui também electricista, carpinteiro, canalizador e servente de pedreiro. Uma boa base laboral para agora saber do que falo, quando me entretenho a irritar políticos e outros bem pensantes locais. Quase todos danados, que só não vão responder, porque em grande parte nem sequer conseguem alinhar um texto com 10 frases pessoais limpas.
Este sumário regresso ao passado mostrou-se necessário para chegar ao ponto pretendido. Que é este:  Aqui há uns anos, uma das minhas rendeiras veio dizer-me que libertava o apartamento no fim do mês seguinte. Surpreendido, pois a senhora, que vivia só, tinha sido sempre pontual no pagamento da renda, perguntei-lhe qual o motivo. "Vou viver para outra cidade". Sou manicure e as minhas clientes eram sobretudo as esposas dos senhores oficiais. Umas já se foram, e outras estão a ir-se embora. Tomar está a morrer aos poucos. Por isso vou para outra terra."
Os eleitos da actual maioria, bem como os respectivos apoiantes e claques, estão todos satisfeitos com a recente vitória eleitoral. Até festejaram, e já começam a abusar, transformando por exemplo o acto de posse numa custosa e parola cerimónia de exaltação. Compreende-se. Mas no lugar deles, seria bem mais comedido. "Não há bem que sempre dure, nem mal que não se acabe", diz o povo.
O modelo de sociedade que vão impondo paulatinamente, com larga predominância do sector público, transforma os cidadãos em dependentes, assistidos e conformados. Contentes com o que está, porque incapazes de imaginar outros modelos societais. Pensar cansa, quando não se está habituado.
O problema é que esse mundo de ornamentações, de eventos, de subsídios, de jeitos e de empregos improdutivos, de favor, que é muito confortável, vai-se desmoronando pouco a pouco, inexoravelmente. Porque não produzimos riqueza suficiente para o sustentar.
Foram-se "as senhoras do senhores oficiais", referidas pela minha ex-rendeira, porque Tomar deixou de ser uma cidade de guarnição. As fábricas fecharam uma após outra, e, sem operários para eventualmente reprimir, deixou de haver necessidade de tropa em quantidade. Acabou-se o serviço militar obrigatório. Segundo as estatísticas do INE, a fuga da população continua, empurrada designadamente por um custo de vida dos mais elevados da região. Não tardam portanto outros desastres. Tendo em conta a crise da natalidade, começa a haver  escolas a mais, e por conseguinte professores excedentários.
Uma vez que há falta de docentes qualificados nos grandes centros urbanos da faixa costeira, está-se mesmo a ver a continuação do filme. Seguir-se-ão outros funcionários. Do fisco, por exemplo. Ou judiciais, porque o Tribunal de círculo e a Comarca de Tomar já se foram, num silêncio geral. Ninguém protestou, ou sequer abordou o assunto. A informação local tem medo.
Com cada vez menos funcionários públicos, que não ganham bem, mas tão pouco temem o desemprego, o sector dos serviços começa também a definhar. De tal forma que se tornará cada vez mais necessário completar a recente frase da srª presidente da câmara, que tenciona "devolver o rio aos tomarenses". É boa ideia, convindo contudo acrescentar "que ainda cá estiverem"
Conjuntura desagradável e sem solução? De modo algum! Estamos como nas corridas de toiros à portuguesa. Formando um grupo valente de forcados, pode-se pegar o bicho pelos cornos ou, se impossível, de cernelha. Agora se  deixarmos o animal à vontade na arena, é bem capaz de saltar as barreiras e começar a ferir pessoas. É tudo uma questão de atitude. 
Fazer campanha  e vencer é uma coisa. Governar é outra, bem diferente. Exige planos. Uma táctica e uma estratégia. Onde estão?

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