ADVERTÊNCIA
O texto seguinte é uma obra de ficção, com factos, locais e personagens imaginados pelo autor. Qualquer semelhança com a realidade será simples coincidência O autor declina desde já qualquer responsabilidade, caso tal venha a ocorrer.
Esta história desenrola-se na actualidade, num país algures no mundo, com 308 empresas públicas de serviços, financeiramente dependentes de uma empresa central do mesmo tipo. Os habitantes desse país pagam, sob a forma de excessivos impostos directos e indirectos, a maior parte dos serviços de que beneficiam, menos os consumíveis, como por exemplo a água, que são pagos em separado, depois de fortemente onerados com taxas locais. Donde resulta portanto que as ditas empresas funcionam em regime de monopólio, cada uma na sua área de jurisdição. Praticamente, nenhuma empresa concorrente fornece os mesmos serviços. Quando isso acontece em relação a alguns poucos, trata-se de concessões, com as inerentes obrigações, entre as quais a cobrança das ditas taxas.
Graças ao seu estatuto de monopólios, tanto a empresa central como as restantes, pouco ou nada se preocupam com as despesas de funcionamento. A título de exemplo, a empresa da terra onde decorre esta história, alimenta 520 empregados para uma população de 35 mil eleitores. O que representa 40% do orçamento total, só para pagar aos empregados e satisfazer as inerentes obrigações legais.
Para complicar as coisas, a gerência de cada uma das empresas é escolhida por votação a cada quatro anos. O que significa que, sobretudo nas localidades mais pequenas, onde esse tipo de empresa é o principal empregador, a escolha dos novos gerentes depende em grande parte, quando não totalmente, dos empregados dessa empresa dominante.
Resulta do anterior que, ao longo dos anos, acossados pela necessidade de agradar aos empregados- eleitores, como forma de conseguir a reeleição, muitos gerentes, mas não todos felizmente, vêm adoptando uma curiosa política: Favorecem deliberadamente os empregados, tanto os activos como os já aposentados, mesmo quando para isso são forçados a prejudicar todos os consumidores dos seus serviços. Com tarifas e taxas exorbitantes, por exemplo.
Qual a relação entre a foto e o texto? Os camelos, claro está. Entre os quais o escriba, contribuinte como os demais.
Como se tudo isto não fosse já assaz grave, os referidos empregados têm, quase todos, empregos vitalícios. São inamovíveis. Mesmo aqueles que não exercem de facto qualquer tarefa precisa. Os excedentários, ou supérfluos. Munidos de tal viático, alguns têm manifesta tendência para abusar. Para se considerarem donos e senhores da empresa que lhes assegura o vencimento. Tipo "nacionalizada - nossa", dos idos de 75.
Daí, desse posicionamento arrogante, resultam hábitos pouco saudáveis, nomeadamente a falta de assiduidade e de pontualidade, bem como a tendência para complicar a vida aos cidadãos, de maneira a depois facilitar por baixo da mesa. Nessa terra de que já se falou acima, por exemplo, quando um gerente mais corajoso mandou instalar um controle de assiduidade e pontualidade, o mesmo avariou passado pouco mais de um mês. E nunca mais foi reparado, apesar de já terem decorrido mais de cinco anos. Caso para dizer "Que avaria tão complicada!", mas também que a insólita situação mostra quem manda realmente nessa empresa pública. Os factos não enganam.
Perante tão estranho estado das coisas, a dada altura uma gerente recém-eleita tentou moralizar a situação de forma parcial, acolitada pelo seu chefe de gabinete. Foi sol de pouca dura. O chefe de gabinete acabou escorraçado, por razões até hoje por esclarecer cabalmente. E com os idiotas úteis do costume convencidos de que foi castigado por isto, quando afinal pode muito bem ter sido por aquilo, conforme adiante se verá.
Animados com essa vitória do tradicional sobre a novidade, os líderes do movimento que culminou com a saída do parceiro da gerente, resolveram tentar ir mais além. Arquitectaram um plano para calçar os patins à gerente. Tramar a patroa para vê-la pelas costas. Nesse sentido, numa longa série de mal entendidos, que passou pela deliberada sonegação de correspondência e outros factos da mesma natureza, conseguiram que a gerente acabasse por ser condenada em tribunal, como resultado da queixa de um cidadão, cansado de esperar em vão.. Surpreendida pela condenação, se calhar julgando-se também acima das leis, a gerente apenas encontrou uma explicação aceitável para ambas as partes (ela e os que tentam calçar-lhe os patins): Algo terá falhado em todo o sistema, disse a senhora.
A confirmar tal tentativa deliberada e conseguida de lesa-patroa, praticamente ao mesmo tempo, um outro cidadão, sem qualquer relação com os factos já relatados, porém conhecido como contestatário e exigente, requereu um determinado serviço. Findo o prazo legal para a prestação desse serviço, sem qualquer resposta, continuou a aguardar. Decorridos quarenta dias, quando o prazo inscrito na lei é de apenas dez, decidiu alertar a gerente, referindo a estranha ausência de resposta e mencionando a possibilidade de recorrer ao tribunal competente.
Só então recebeu esse cidadão queixoso uma informação escrita, referindo que o serviço solicitado estaria à disposição no dia tal, em tal parte, prestado por fulano de tal, conforme constava do mail enviado 5 dias antes. Curiosamente -o acaso tem destas coisas- tal mail nunca foi recebido pelo dito cidadão, e portanto nunca foi enviado, o que o levou a tentar reconstituir os factos.
Segundo a conclusão a que conseguiu chegar, terá havido duas tentativas para que recorresse aos tribunais contra a gerente. A primeira, consistiu em ultrapassar largamente, de forma deliberada e sem qualquer justificação plausível, o prazo fixado na Lei, que é de dez dias. Para irritar o cliente. A outra foi mais maquiavélica. Pretendeu-se fazer crer à gerência que o cidadão requerente já fora avisado, quando tal não era o caso, como se veio a descobrir de modo fortuito..
De forma que, você que leu até aqui, doravante já sabe: Quando quiser tramar uma gerente de que não goste por qualquer razão, apresente-lhe como idóneos factos que são mentirosos. Alternativos, na linguagem trumpista. O tempo e os outros farão o resto. E a vítima acabará murmurando, uma vez mais, que algo terá falhado em todo o sistema, pelo que se irá proceder à abertura de um processo de averiguações.
Citando Vasco Pulido Valente, "O mundo está cada vez mais perigoso". Mas, pelo andar da carruagem, não são previsíveis mudanças substanciais de percurso. Tanto mais que a empresa nacional, por vocação e para agradar aos seus parceiros de ocasião, também está a especializar-se na protecção excessiva aos seus empregados, tanto no activo como já pensionistas, bem como em factos alternativos. Planos B, dizem eles. Para tentar durar, durar, durar, como as pilhas Duracell.
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