quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

 


Esclarecimento prévio

Não é a primeira vez, longe disso, que quando se propõe nas redes sociais o desenvolvimento turístico de Tomar, aparecem comentadores anónimos contra tal ideia, porque o turismo só cria empregos precários e mal pagos. Para melhor informação de todos sobre tal matéria, segue mais uma tradução do diário francês LE MONDE. A realidade nem sempre é o que parece, quando vista de Tomar.

"Tripulantes cubanos 
explorados nos navios de cruzeiros

Uma queixa por "escravatura", apresentada no Tribunal Penal Internacional, em Haia (Holanda), revela as condições de vida desses trabalhadores, obrigados a entregar 80% do salário a uma agência do estado cubano.

Angelina Montoya
Publicado em 27/01/2022 às 11H32 de Paris - Leitura 4 minutos
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https://www.lemonde.fr/international/article/2022/01/27/des-marins-cubains-exploites-dans-des-bateaux-de-croisiere_6111202_3210.html

"Centenas de tripulantes cubanos são alegadamente explorados nos navios de cruzeiros de luxo. E banidos do seu país durante oito anos, caso não regressem após ter terminado "a missão". Eis a acusação formulada ontem, 26 de Janeiro, por organizações de defesa da democracia em Cuba, que afirmam, pela terceira vez desde 2019, que o governo de Havana trata como "escravos" os profissionais -médicos na sua maioria, mas também artistas, atletas, professores, e tripulantes de navios- enviados para o estrangeiro.
Uma queixa por "escravatura" de 110 médicos cubanos foi entregue em 2019 contra as autoridades cubanas perante o Tribunal Penal Internacional, em Haia, e na ONU, em Genebra. Os médicos, assegurava o documento, podiam não ser totalmente voluntários para as "missões" que se tornaram um instrumento essencial da diplomacia cubana e da sua economia. Até 90% do salário era entregue ao governo cubano, não podiam casar-se sem autorização e eram banidos durante 8 anos do seu pais natal em caso de "deserção" -entre muitas outras limitações. Em 2020 foram acrescentados mais de 600 novos testemunhos.
Na passada terça-feira, as organizações Prisoners Defenders, de Madrid, o Centro para a abertura e a desenvolvimento da América latina e a União Patriótica de Cuba, cujo dirigente José Daniel Ferrer Garcia, está preso em Cuba, entregaram ao TPI e à ONU um terceiro documento, apoiado desta vez em 1.100 testemunhos directos. Nele se lê que cerca de 40.000 profissionais "desertores" foram banidos de Cuba, e entre 5.000 e 10.000 estarão actualmente na impossibilidade de rever os seus filhos.
O texto inclui testemunhos de tripulantes (ajudantes de cozinha, empregadas de quartos, recepcionistas, técnicos...), contratados pelos barcos de cruzeiro e submetidos a condições de trabalho similares.
Estes cubanos, entre os quais dois aceitaram  responder às perguntas do Le Monde, sob condição de manterem o anonimato, trabalharam nos navios da MSC Cruzeios, filial da MSC , de origem italiana e cuja sede é em Genebra, na Suiça. Para contratar cubanos, MSC devia passar pela SELECMAR, agência do Estado cubano, encarregada de recrutar e formar os tripulantes.
Vários milhares de tripulantes trabalham em navios internacionais. Reynaldo (nome alterado a pedido do interessado) pensa que eram cerca de cem  no barco onde ele trabalhou durante 9 meses em 2019. Selectmar assegura  respeitar os acordos estabelecidos pela Organização Internacional do Trabalho. Porém, segundo os contratos de trabalho publicados no documento antes citado, 80% do salário base dos empregados cubanos -entre328 e 408 euros mensais, de acordo com dois contratos anexados à queixa, era entregue à Selecmar. Esta reversão aparece com sendo válida "unicamente para os tripulantes filipinos e cubanos."
"Como todas as companhias marítimas, MSC Cruzeiros teve de pagar os montantes solicitados pela Selecmar pelos tripulantes cubanos. Era uma exigência das autoridades locais", confirma a MSC. Em Abril de 2020, perante as numerosas queixas dos tripulantes,  Havana anunciou que estes passariam a receber 100% do seu salário, mas que 30% deviam ser depositados numa conta em Cuba e em moeda cubana.
"Trabalhei seis meses seguidos, sem qualquer dia de descanso, sem férias, dez a doze horas por dia", declarou uma antiga empregada. Contando as horas extraordinárias, os fins de semana, etc. recebia menos de 900 euros por mês." Em média, segundo Javier Larrondo, da ONG Prisoners Defenders, os tripulantes terão trabalhado 67 horas semanais, muito além do limite  das 48 horas imposto pela convenção do trabalho marítimo.
MSC nega qualquer forma de exploração: "Todos os tripulantes cubanos da MSC Cruzeiros foram sempre tratados equitativamente." Esta afirmação  provoca o riso de Reynaldo, cujo salário de base era para ele também de 400 euros. "Se ganhava mais, era com as horas extraordinárias e as gratificações."
Segundo os documentos da queixa antes referida, os empregados não dispunham de liberdade de movimentos, e acusam a MSC de ter  apoiado o governo cubano, nas suas tarefas repressivas. Nalgumas escalas, os tripulantes cubanos eram impedidos de vir a terra. "O comissário de bordo de MSC ficou com o meu passaporte logo que cheguei ao barco, assegura Margarita. Perguntei aos meus colegas porquê e disseram-me que era porque, se um tripulante cubano aproveitava a vinda a terra para desertar, MSC tinha de pagar 10.000 euros de compensação ao governo cubano." Javier Larrondo reconhece não ter qualquer documento que prove esta acusação, formalmente desmentida pela MSC. Mas tanto Margarita como Javier asseguram que só puderam recuperar o passaporte no final do contrato. "Davam-nos um documento de identidade para poder desembarcar", afirma Reynaldo -que teve conhecimento de 26 "desertores" entre a centena de cubanos que estavam com ele a bordo do navio.
Apesar de ambos terem honrado o contrato até ao fim, sofrem agora a sanção do banimento. Margarida obteve documentos oficiais da Selecmar -que não respondeu ao pedido de informação do Le Monde- e do ministério do interior cubano, que confirmam o seu estatuto de "desertora", e a proibição de poder entrar no seu país durante oito anos.
Tanto Margarita como Reynaldo têm medo das consequências para a sua família, caso viessem a ser identificados. "Podem perder o seu trabalho, ser seguidos, , interrogados, murmura Reynaldo. Viajando dei-me conta que na ilha somos manipulados. Para mim, Cuba acabou."

Angelina Montoya

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