quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

 



Castelo do Bode, turismo, água da rede

Na EPAL o custo da água diminui com a distância

Um leitor simpático alertou Tomar a dianteira 3, via mail, para a situação da barragem do Castelo do Bode. Juntou até duas imagens, mostrando o nível da albufeira, bem abaixo do usual nesta altura do ano, e aproveitou para referir a anunciada instalação de painéis solares naquele lago.
Embora possa não parecer, e os tomarenses, tal como os outros povos vizinhos da albufeira, não mostrem grande interesse, a verdade é que o problema do Castelo do bode é muito  grave e complexo. Começa com a questão da finalidade da barragem. Construída nos anos 50 do século passado, para produzir energia hidroeléctrica, foi mais tarde transformada em reservatório para o abastecimento de água a Lisboa e arredores. Desde então, as suas turbinas, que são das maiores do país, só voltaram a funcionar para facilitar o arranque da rede após queda brusca, dada a sua grande força de inércia. 
A nova afectação da barragem, que já dura há décadas, é obviamente uma das duas causas do preocupante nível geral da albufeira, uma vez que o abastecimento à região de Lisboa consome bastante mais que o antigo caudal necessário para movimentar as turbinas produtoras de energia hidroeléctrica. A outra causa é a fraca pluviosidade, contra a qual nada há a fazer. A não ser transvases do Cabril e da Bouçã, enquanto der.
Além do problema da altura da água, fala-se agora na instalação de painéis solares,  em parte da superfície do lago, sem mais precisões. É mais um caso em que Lisboa decide e os provincianos devem acatar, sem sequer terem sido antes informados nem ouvidos. Tal como aconteceu em tempos com a servidão imposta pelo aproveitamento da água para consumo humano, o que impediu muitas actividades nas margens e na própria albufeira, assim condicionando o desenvolvimento de toda aquela zona. Outros tempos, mesmos hábitos autoritários.
Procurando compensar de algum modo tais inconvenientes, a Assembleia Municipal de Tomar aprovou nos anos 80 uma proposta para que a EPAL, que capta, trata e  vende a água do Castelo do Bode, pagasse uma pequena soma por cada litro de água às autarquias ribeirinhas. A tradicional falta de informação municipal não permite saber se tal proposta chegou ou não a ser implementada. Mas a situação tem vindo a revelar-se extravagante.
Nestas coisas dos negócios da água, há a compra "em alta" para vender "em baixa". A Tejo Ambiente, por exemplo,  herdeira dos SMAS,  compra "em alta" à EPAL, para vender "em baixa" aos consumidores tomarenses. Já a EPAL, com este ou outros nomes comerciais, fornece "em alta" e vende "em baixa", em Lisboa e na região, uma vez que na origem se chamou sucessivamente Empresa Pública das Águas Livres e Empresa Pública das Águas de Lisboa.
Até aqui tudo bem. O problema é que a água é vendida "em alta" pela EPAL, três vezes mais cara em Tomar do que em Lisboa. É verdade. E quem se queixa é a própria presidente da câmara de Tomar e ex-presidente da Tejo Ambiente. Sabe portanto do que fala, e não costuma ser contestatária:
Temos assim o mundo praticamente às avessas. Tradicionalmente, a água, que é um bem público gratuito, passou a ser paga para compensar os custos, que são 4, a saber : captação, tratamento, transporte e distribuição. Pois no caso em análise, da EPAL, o factor custo de transporte joga ao contrário. Quanto mais longe estiver o consumidor em relação à captação, menos paga pela água consumida. É assim que, em Lisboa e arredores, pagam muito mais barato pela água do Castelo do Bode do que os consumidores de Tomar,  Abrantes ou Ferreira do Zêzere, que estão mesmo ao lado da albufeira.. Explicações devem ser solicitadas à EPAL, e às autarquias que em tempos celebraram tais convénios leoninos. Não a quem redige estas linhas, que se limita a pagar no fim do mês.
Seguindo o mesmo raciocínio, é previsível que os futuros consumidores da energia eléctrica produzida pelos painéis solares a instalar, venham a pagar também em função da distância. Quanto mais longe mais barato, como no caso da água. Aqui fica desde já o alerta para os potenciais consumidores do norte do país, uma vez que agora se pode escolher o fornecedor de electricidade, mas ainda não o da água. Optem pela energia verde produzida pelos painéis instalados na barragem do Castelo de Bode. Fica muito mais em conta, para quem como vocês está mais longe.
Mas depois, façam-nos um grande favor. Protestem contra os citados painéis, quando vierem a provocar a eutrofização da água da albufeira, com o consequente aparecimento de algas. que vão complicar a captação e o tratamento da água pela EPAL. Tudo provocado pela redução da exposição solar, devido aos painéis justamente. Nenhum player consegue ganhar sempre em todos os tabuleiros, e o excesso de fitoplancton,  tendo como origem os fosfatos e nitratos, não perdoa. Já pensaram nisso, senhores da EPAL? É que depois do mal aparecer, vai ser muito mais difícil encontrar uma solução.

5 comentários:

  1. É capaz de ser uma boa ideia, 50Mw de potência solar é quase um terço da potência total da Central hidroelétrica, que penso ser de 159MW. Mas meu caro António Rebelo, aí pelo Brasil, e especialmente agora com as eleições para o governo da República, também se discutem as alterações climáticas e a política energética do brasil? Fala-se na descarbonização da economia como se fala aqui na Europa?

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    1. Não é fácil responder à sua pergunta, amigo Helder. O Brasil é um país imenso. De Fortaleza, onde estou a escrever, a S. Paulo, capital económica do país, é como de Lisboa a Berlim, sem a rede de auto-estradas.
      Aqui pelo Ceará, um dos 27 estados federados, maior que Portugal, mas com pouco mais de 6 milhões de habitantes, nesta altura fala-se no hub do hidrogénio, no porto do Pecém e de encontrar um candidato de 3ª via, entre Bolsonaro e Lula. Perfilam-se 3. O Cid Gomes, que é cearense, o ex-ministro Moro e o governador de S. Paulo, João Dória.
      Sobre ecologia, li aqui há dias um texto interessante, cujo autor estranhava o grande interesse da esquerda europeia pela desmatação na Amazónia, mas nada dizendo sobre as imensas florestas irmãs, em África e na Ásia. É capaz de ser porque nos Congos, por exemplo, os presidentes não são de extrema direita. Digo eu...

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    2. Já percebi que não está na agenda do governo, o que não é de espantar tendo o Bolsonaro como presidente. Tenho curiosidade de saber se o Lula vai adoptar essa política ecológica ou dar prioridade ao crescimento económico. Os USA são maiores que o Brasil e o Biden adoptou essa politica, agora os carros, autocarros e os camiões vão passar a ser electricos. Em Portugal é uma loucura com estas coisas da transição energética. A sôtora Anabela Freitas também é toda ecológica, ela desfêz-se do opel insígnia e comprou um Mercedes híbrido topo de gama, que era para poupar e para proteger o meio ambiente!!!!! Até já fecharam as centrais termoelétricas como Sines e o Pego. Há empresas como a Caima em constância a produzir electricidade a partir da biomassa e biogás, eles até constituíram uma empresa específica para lidar com o negócio da geração de electricidade, a Greenvolt, o CEO é o Manso Neto, aquele que ficou famoso por se ver envolvido em processos sobre corrupção, não sei como ficou aquilo. Tinha essa curiosidade ....

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  2. Exmo sr Professor A questão é que a EPAL ira fazer ouvidos surdos a este problema porque já devem ter vendido a concessão sem sequer consultar as populações é a lei do eu quero posso e mando e tu pagas e não resmunga. Agora que a água está mais baixa não vejo a Epal preocupada com o lixo que esta pelas margens agora a descoberto... já sei não tem rendimentos que cheguem para fazer essa manutenção pela albufeira. Cada vez vejo o nosso concelho mais empobrecido e manietado por certos indivíduos porque se assim não fosse era apresentado um estudo sério mas isso não interessa mostrar ao cidadão comum. Há e para não falar que os painéis nos ditos locais onde dizem que os irão colocar nos anos de seca tal como agora vão ficar pendurados pelas encostas e assentes na lama o que será interessante de ver. Uma boa semana,bem haja. Att Mendes

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  3. As preocupações com painéis solares flutuantes podem ser ou não meritórias (não tenho dados suficientes, para além de se saber que é energia limpa, reduz a evaporação, serão 60ha em 3000ha e que poderá ser revertido rapidamente).
    Mas sobre a qualidade da água, já ninguém fala da total transformação da floresta para monocultura de eucalipto, da ausência de saneamento básico e tratamento de efluentes de aviários , suiniculturas, etc.. mas acima de tudo ninguém fala das escombreiras da Panasqueira - 200m de altura de detritos nas margens do rio que abastece de água 3milhoes de pessoas:
    https://jra.abae.pt/plataforma/artigo/rio-zezere-em-perigo-altas-quantidades-de-arsenio-e-barragem-em-risco-de-colapso/

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