quarta-feira, 15 de março de 2017

O descalabro camarário

Até dormi mal. O que é extremamente raro. Mas a indesmentível gravidade do caso justifica a insónia parcial.
Já me haviam chegado indícios de que a situação da autarquia  é gravíssima e quase sem conserto possível. A exigir uma mudança rápida, corajosa e competente. Um dos actuais eleitos com experiência admitiu recentemente, junto de amigos, que embora os escritos de Tomar a dianteira sejam em geral bastante duros e certeiros, não traduzem nem lá perto a trágica realidade autárquica nabantina. Designadamente pela geral impossibilidade de obter informações em tempo útil, devo acrescentar.
Estava nisto quando mão amiga me fez chegar um relato ao vivo da reunião camarária de ontem, 13 de Março, da autoria de Elsa Ribeiro Gonçalves. Li e fiquei muito satisfeito. Constatei que em Tomar também se faz bom jornalismo. Objectivo, oportuno e bem escrito, embora infelizmente nem sempre assim aconteça. Os leitores habituais sabem a que me refiro. Não adianta mexer mais na ferida, não vá ela infectar. Ou, noutra perspectiva: Há coisas que quanto mais se lhes mexe, mais mal cheiram.
Mas passemos ao primordial. Debatía-se, no areópago executivo municipal, a proposta de auditoria ao Departamento de obras municipais e ao ex-Departamento de urbanismo e gestão do território, actual divisão homónima. Apresentada pela vereadora substituta Beatriz Schulz, do PSD, a citada pretensão não era assaz precisa, nem quanto ao âmbito, nem quanto  à duração, segundo a relativa maioria PS/CDU.
Foi então que, algo inesperadamente, o vice-presidente Hugo Cristóvão, do PS, em tom de quem aproveita para despejar finalmente o saco, largou uma bomba bem pesada, cujos estilhaços, creio eu, vão causar danos muito elevados, quer antes, quer nas próximas autárquicas. Eis o descomunal engenho explosivo:


Por conseguinte, em pleno século XXI, num país ocidental da União Europeia e numa terra que nem sequer é das mais atrasadas (ou pelo menos não era, até há poucos anos...), jazem numa sala-jazigo da autarquia três centenas de processos, a aguardar destino há 20 anos. Um cidadão-eleitor-pagador de taxas e impostos lê, relê, volta a ler e tem dificuldade em acreditar. Depois, que remédio, aceita a tragédia, pensando para consigo que não será certamente por falta de funcionários. Segundo fonte fidedigna, o Departamento de obras municipais tem 11 (onze) engenheiros e a Divisão de gestão do território 3 (três) engenheiros e 5 (cinco) arquitectos. Não se pode portanto aplicar o tradicional dito popular  "a Ordem é rica e os frades são poucos", porque é exactamente o oposto.
Ante semelhante situação de facto, inacreditável e inaceitável em 2017, quem minimamente informado vai querer investir em Tomar? Qual será a situação nos outros serviços camarários? Que tomarense, amante da sua terra, poderá depois desta revelação, continuar a viver descansado nas margens nabantinas? Que futuro para os mais novos?
O que o vereador Hugo Cristóvão disse, em plena sessão oficial da autarquia, degrada a confiança que os eleitores ainda poderiam depositar nos seus eleitos. Confirma também, sem margem para dúvidas, a manifesta incapacidade das sucessivas vereações, para assegurar a gestão da coisa pública com um mínimo de dignidade e de eficácia. Trezentos processos à espera há 20 anos! E o resto que ainda não se sabe cá fora? Que é feito da apregoada competência e do empenhamento profissional dos funcionários, sobretudo dos quadros  superiores? O que os leva a pactuar, calados que nem carpas, com eleitos manifestamente incapazes?
Bastante mais grave ainda, se tal é possível: Os restantes membros do executivo, presentes na reunião, ouviram e calaram, a julgar pelo relato supracitado. Todos praticamente com a mesma vivência política e os mesmos valores, bons conhecedores da casa, pareceu-lhes uma situação normal. Mas não é. Pelo contrário. Envergonha-nos. Ultraja o serviço público e corrói a democracia. Constitui um condenável e praticamente intransponível repelente para os potenciais investidores. Mostra a inépcia dos políticos que temos e prenuncia o descalabro final da Câmara de Tomar, caso lhe não acudam quanto antes, de forma ousada e com remédios adequados.
Pobre terra, que merece melhor sorte!

2 comentários:

  1. Caro amigo, não acredite em tudo o que ele diz, até porque oiço por aí que não é com verdades que ele pretende fazer os possíveis para não voltar a dar aulas.
    E se reparar, desde inícios de mandato que se houve dizer que iam haver processos judiciais e até prisões e até agora... Infelizmente, para estes políticos vale de tudo para tentar limpar a pele deles, o problema é que só mancham a imagem da nossa cidade e escurraçam possíveis novos habitantes.
    Estamos muito mal encaminhados, estamos...
    Abraço.
    António José

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    1. O facto é que ele afirmou e ninguém o desmentiu. E falava como vice-presidente, em plena reunião oficial, portanto no local mais indicado para isso. Por conseguinte, se essa questão dos 300 processos adormecidos fosse falsa, decerto que alguém o teria já denunciado.
      Assim, as perguntas que se impõem parece-me serem estas: Se naquele serviço há 300 processos "enterrados", qual será a situação nos outros? Quem pode confiar numa câmara assim?

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