Após ter comparado resultados eleitorais no distrito de Santarém, pareceu-me oportuno proceder como nos ensaios clínicos. Comparar com um grupo-testemunho. Escolhi o distrito de Leiria, por ser o vizinho do lado e por integrar a faixa costeira. Aquela parte do território que vai crescendo economicamente, embora devagar, enquanto o interior vai definhando de forma mais acelerada. Recordo aos leitores que se trata de verificar 1 - Se o aumento da taxa bruta de abstenção é um fenómeno generalizado no país, ou algo que só existe no distrito de Santarém; 2 - Se essa tendência nefasta é mais acentuada nos concelhos rurais ou nos urbanos; 3 - Se a usual segmentação faixa costeira/interior tem no caso alguma relevância.
Comecemos então por mostrar elementos essenciais dos dois grupos em comparação:
Concelhos Eleitores inscritos Inscritos no maior concelho Abstenção 2005 e 2013
Leiria 16 427.002 Leiria 113.378 39,54% 49,59%
Santarém 21 399.173 Santarém 53.418 38,44% 46,32%
A título de curiosidade, em 2005, o distrito de Santarém ainda tinha mais eleitores inscritos que o de Leiria. 388.249 e 387.376, respectivamente.
Taxa bruta de abstenção no distrito de Leiria, em 2005 e 2013
Concelhos TBA em 2005 TBA em 2013 Diferença 2005/2013
Alcobaça 43,38% 57,92% +14,54%
Alvaiázere 37,84% 43,90% + 6,06%
Ansião 35,57% 45,61% +10,04%
Batalha 39,70% 59,44% +19,74%
Bombarral 44,94% 57,39% +12,45%
Caldas da Rainha 51,74% 60,88% + 9,14%
Castanheira de Pera 27,96% 35,09% + 7,13%
Figueiró dos Vinhos 27,91% 36,79% + 8,88%
Leiria 42,72% 63,62% +20,90%
Marinha Grande 50,51% 60,63% +10,12%
Nazaré 46,03% 55,16% + 9,13%
Óbidos 41,93% 51,54% + 9,61%
Pedrógão Grande 29,40% 41,35% +11,95%
Peniche 49,77% 64,24% +16,47%
Pombal 48,31% 64,00% +15,69%
Porto de Mós 36,53% 55,65% +19,12%
Conferidos os dados, a conclusão é que não deixam dúvidas. Existe uma fuga crescente dos eleitores que ainda escolhem, isto é, que ainda optam por uma das formações concorrentes. No distrito de Leiria, o problema é ainda mais grave que no de Santarém. Na própria cidade do pinhal, a taxa bruta de abstenção cresceu 20,90%, em 8 anos. E o fenómeno é semelhante nos outros concelhos costeiros ou mais urbanos. A excepção é Caldas da Rainha, cuja taxa bruta de abstenção já era em 2005 superior a 50%.
Em contraste com as áreas mais urbanizadas, os concelhos rurais do interior (Alvaiázere, Ansião, Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos e Pedrógão Grande), apresentam taxas brutas de abstenção inferiores a 50%, ou mesmo a 40%, nos casos de Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos. A evidenciar que abstenção, votos brancos e votos nulos provêm sobretudo do eleitorado mais esclarecido, pelo que só podem representar formas de protesto contra a actual organização eleitoral.
Concluindo, penso poder citar-se a velha e conhecida letra: tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado. Perante a indiferença generalizada de quem podia, mas não quer de forma alguma, alterar a lei eleitoral. Pudera! Não querem serrar o ramo no qual estão confortavelmente sentados. O problema só terá solução quando, pelo caminho que as coisas levam, deixar de haver eleitos representativos, por não haver eleitores em percentagem suficiente. Já faltou mais. Basta pensar que, conforme já referido anteriormente, Anabela Freitas foi eleita com apenas 5.479 votos, o que equivale a apenas 14,68% dos inscritos. É legal, sem qualquer dúvida. Mas será moralmente aceitável? Significa que em cada 100 eleitores inscritos, 85 não votaram nela. E o mesmo acontece por esse país fora.
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