quinta-feira, 8 de junho de 2017

Optimismo e turismo - 2

Viagem

O pico de Vik - continuação

"Que mudanças provocaram estes visitantes de todas a nacionalidades? O rosto da nossa interlocutora fecha-se. Em Fevereiro do ano passado, teve de amparar moralmente uma turista chinesa, cujo marido foi arrastado por uma onda mais forte. A praia de Reynisfjara é bem conhecida dos locais pelo mar muito perigoso. Após o afogamento do turista chinês, foram destacados polícias para a praia, enquanto não chegam os painéis que indicam zona perigosa, já encomendados. Infelizmente, em Janeiro deste ano, uma turista alemã perdeu a vida numa praia vizinha. E hoje mesmo, o filho de Halla, que almoçava tranquilamente no restaurante materno, foi forçado a mergulhar no mar, apesar dos 3º centígrados na água, para salvar uma criança.
Entusiasmados com a beleza da Islândia, os turistas esquecem por vezes as mais elementares regras de prudência. Nas estradas, os acidentes com condutores estrangeiros aumentaram 80% entre 2015 e 2016, segundo as autoridades. As estradas têm muitas ratoeiras. Há muitos automóveis estacionados de qualquer maneira, só para ir fotografar uns cavalos, ou uma aurora boreal, por exemplo. Nestes últimos cinco anos vários turistas perderam a vida durante  passeios, uns devido a quedas, outros por hipotermia, outros ainda em acidentes de mergulho. Em 2016 um drama foi evitado mesmo à justa, em Jökulsarlon, quando 70 turistas que subiram para uma placa de gelo para fotografar uma foca, começaram a derivar, antes de terem sido bloqueados num canal de acesso ao mar, por mero acaso.

Os órgãos basálticos da praia de Vik, na Islândia. Ao fundo, o "pénis marítimo". Mais de um milhão de viajantes vão passar pela aldeia em 2017. Foto Tolga Akmen/Shutterstock/SIPA.

Para os habitantes de Vik tudo isto é novo. E triste, bem entendido. Mas não é razão suficiente para desejar o fim desta idade de ouro. "Às vezes já temos de fazer fila na mercearia e também há gente a mais nos banhos quentes da piscina municipal. Mas não me esqueço que foi o turismo que nos salvou da crise," explica-nos Thorir Kjartansson, que dirigiu em tempos uma empresa de tecidos de lã. Agora vende na sua loja magníficas fotos de auroras boreais em pen USB, enquanto espera o seu euromilhões: a venda dos 150 quilómetros quadrados de terrenos que possui, em conjunto com as irmãs. Nessas terras fica situada a soberba montanha-mesa de Hjörleifshöfdi, no topo da qual estão sepultados os seus avós, ao lado de um dos mais antigos colonos da Islândia, aqui chegado no século IX.
Kolbrun Hjörleifsdottir mantém vivo o nome desse viking. É uma mulher de cabelos escuros, uma raridade por aqui, que abriu o primeiro alojamento local da aldeia, Arsalir Guesthouse, em 1990. Depois acabou por abandonar o seu emprego de directora da escola, para se dedicar inteiramente à hotelaria. Tem uma taxa de ocupação anual média de 90%, mas recusa anunciar nos sites de reserva da Net, de forma a poder acolher os viajantes de última hora. "Antes deixávamos as portas abertas. Agora alguns já as fecham à chave porque não nos conhecemos todos. Mas também foram os turistas que nos abriram os olhos para as belezas do nosso país. Antes esquecíamo-nos por vezes de olhar à nossa volta."
A invasão turística vai continuar. Vinte seis companhias aéreas voam para a Islândia. O cinema populariza as paisagens naturais. As redes sociais exageram nos qualificativos. Os chineses crescem exponencialmente. Por outro lado, devido aos preços elevados, que vão subir ainda mais com o aumento do IVA em 2018, as estadas são cada vez mais curtas (3,8 dias em média), o que favorece os destinos mais acessíveis, prejudicando o turismo-aventura.
Uma vez que não pode limitar a afluência turística, Vik tenta controlar os efeitos do turismo no ambiente. Designadamente mediante a integração da aldeia no Katla Geopark da UNESCO. No posto de turismo, Beata Rutkovska está contente ao mostrar-nos a nova sinalização, que proíbe caminhar nos campos nas proximidades das zonas de nidificação, ou praticar campismo selvagem. Os novos painéis estarão instalados antes do verão."

Olivier Joly, Le Monde
Tradução e adaptação de António Rebelo

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