terça-feira, 25 de abril de 2023


Comemorações

25 DE ABRIL SEMPRE?

Lembro-me bem daquela manhã húmida,  em que as marchas militares e os apelos a ficar em casa de um Movimento da Forças  Armadas, substituiram na rádio a música ligeira e as usuais notícias visadas pela censura. Barba, banho, pequeno almoço nas Estrelas, com o rádio portátil ao lado, autocarro para as aulas em Ourém. Era dia de chuva, pois esqueci-me do respectivo chapéu naquela vedação junto ao rio. Chegada a Ourém, intrigado com aquela do "movimento" a levar-me a pensar na direita espanhola de Primo de Rivera. Mas não houve ninguém para me esclarecer.
À hora de almoço, após vários intervalos a ouvir o rádio, regresso a Tomar, já com a certeza de um golpe de Estado em curso. O almejado momento chegara, surpreendentemente liderado pelos próprios guardiões do regime salazarista-marcelista -os militares.
A tarde foi toda de incerteza e inquietação, com ida para a Cerrada dos cães, de forma a aproveitar as potentes antenas do então Posto rádio militar, para sintonizar e ouvir Argel, Estocolmo, Praga e Moscovo. A versão estrangeira do acontecimento nacional, que a portuguesa tardava e podia não merecer crédito.
Só pelas seis da tarde tudo se tornou finalmente claro, com o cerco e posterior rendição da liderança do regime no Quartel do Carmo, perante as tropas de Salgueiro Maia.
Celebrações? Manifestações de alegria? Em Tomar praticamente só aconteceram com o imenso desfile do 1º de Maio, uma semana depois. Por prudência, manha ou oportunismo, os tomarenses só então vieram para a rua apoiar Abril. Nunca mais voltei a ver, desfilando na Corredoura, tantos cravos, nem tanta roupa vermelha...
49 anos depois, como estamos de celebrações de Abril em Tomar? Pouca coisa. Dois torneios desportivos de veteranos. Um almoço-tertúlia em Paço da Comenda. Sessão solene comemorativa do poder nos Paços do concelho. Evento à borla no Cine-teatro, oferta da Câmara, e um insólito almoço comemorativo do PS na Junceira, uma freguesia de direita onde o 25 de Abril nunca ganhou. Em termos de imagem, deve ser uma ocupação simbólica, tipo tomada da Bastilha. Fazem bem, que a  pinga é boa e tristezas não pagam dívidas, nem dão subsídios.
No meio disto tudo, que é afinal pouco, como estamos por comparação? Temos menos população, menos emprego privado e menos indústrias. Temos rede de água com falhas constantes e preços proibitivos. Temos escolas quase sempre em greve. Temos um hospital moderno com doentes esperando horas por uma consulta. Temos menos importância regional. Temos menos alojamento privado e mais alojamento social. Ciganices.
Não temos estruturas básicas de acolhimento turístico, nem planos com futuro, nem temos tido muita sorte com os eleitos que escolhemos. E a liberdade de informação já conheceu melhores dias junto ao Nabão. Assim sendo, 25 de Abril sempre? Quem ainda acredita?
Desculpem qualquer coisinha, senhores do clero abrilista. Se até a Igreja católica, com séculos de experiência, está em crise...


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