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Com evidente obstinação, a autarquia insiste na venda das ruínas do ex-Convento de Santa Iria e do ex-CNA feminino, segundo noticia o Cidade de Tomar de ontem. Desta vez por um milhão trezentos e sessenta mil euros. Porquê tal montante e não outro? Provavelmente nem os respeitáveis cidadãos que votaram a deliberação em causa saberiam explicar, se incitados a fazê-lo.
Sabem, isso sim, insistir numa via que já se revelou infrutífera por diversas vezes, apesar dos reiterados avisos da chamada opinião publicada, designadamente aqui em Tomar a dianteira. Teimosos, surdos ou cegos, recusam perceber o básico. Reconhecer que é fácil determinar ou deliberar e mandar publicar, mas não adianta, porque depois os investidores não acompanham. Porquê?
Basicamente pelas mesmas razões que levaram o governo brasileiro a autorizar uma zona franca em Manaus. A mais de dois mil quilómetros da costa, em plena floresta equatorial, a capital do estado do Amazonas, uma cidade com mais de dois milhões de habitantes, vai-se desenvolvendo a bom ritmo. Em boa parte devido a essa facilidade fiscal, que visa compensar as dificuldades resultantes da distância, dos acessos e do clima.
Embora também situada no interior, Tomar fica a apenas 50 quilómetros da costa, em linha recta. Não está rodeada por uma floresta como a amazónica, e tem um clima temperado. Padece contudo de algo muito parecido com Manaus, em termos práticos: uma burocracia camarária de tipo amazónico, tantas são as exigências colocadas a qualquer investidor. Exagero?
Tomemos o caso das supracitadas ruínas, mais uma vez postas à venda, a menos de um mês do final do mandato. De acordo com o disposto durante o império paivino, cuja sucessão se finou há 4 anos, quem comprar tem de construir um "hotel de charme de quatro estrelas com 60 quartos". Até aqui tudo claro, tudo bem. Mas há as exigências implícitas. De acordo com o PDM em vigor, o projecto a apresentar para aprovação deve obrigatoriamente ter em conta os seguintes condicionamentos:
1 - Zona de protecção da Igreja de Santa Iria
2 - ZEP da Cidade romana de Sellium
3 - Preservação do Pego de Santa Iria
4 - Preservação do Claustro
5 - Preservação do Arco de Santa Iria
6 - Respeito pelas fachadas existentes
7 - Cércea máxima de dois pisos acima da cota de soleira
8 - Sondagens arqueológicas obrigatórias
9 - Escavações arqueológicas inevitáveis, caso as sondagens revelem "vestígios com interesse"
10 - Cumprimento das normas do RGEU, uma regulamentação do tempo de Salazar
11 - Respeito pelas normas hoteleiras internacionais, que estabelecem corredores duplos obrigatórios, os quais não cabem no actual Arco de Santa Iria
12 - Construção obrigatória de um parque de estacionamento com mais de 100 lugares (60 para hóspedes + 40 para empregados).
Além do exposto e do que fica em reserva, avulta ainda a pendência cível com os herdeiros de Alfredo Fernandes, o anterior proprietário do imóvel e terrenos do ex-CNA feminino.
Além do exposto e do que fica em reserva, avulta ainda a pendência cível com os herdeiros de Alfredo Fernandes, o anterior proprietário do imóvel e terrenos do ex-CNA feminino.
Com toda esta parafernália regulamentar, mais umas quantas minudências que o bem conhecido e melhor intencionado império dos sentados não deixará de encontrar oportunamente, quem é o investidor que ousará desbravar semelhante floresta burocrática? Só algum louco ou ignorante. Porque a dita floresta é tão densa que até a própria autarquia já dela foi vítima. Viu-se forçada pela ASAE a encerrar o Parque de campismo, para cumprir legislação autárquica que antes aprovara, mas da qual já ninguém se lembrava...
Por tudo isto, mais uma vez aqui se proclama, para constar onde convier: Só existe uma solução prática, realista e eficaz para as ruínas do ex-convento de Santa Iria e do ex-CNA feminino. O executivo, após aprovação da Assembleia Municipal, para evitar dúvidas e obstar antecipadamente a eventuais resistências, deve ordenar aos seus arquitectos e engenheiros que elaborem o projecto completo para o tal hotel de charme, em conformidade com todas as normas e exigências em uso. Esse projecto será depois submetido à aprovação do executivo, acompanhado pelos pareceres dos serviços competentes. Após a aprovação, a maioria então em funções poderá optar por uma de duas hipóteses: A - Põe as ruínas à venda em hasta pública internacional, com o projecto aprovado e a licença a pagamento; B - Abre concurso para a construção do hotel, uma vez conseguidos os indispensáveis fundos europeus. Terminada a obra, abre concurso internacional de concessão da nova unidade hoteleira, beneficiando da experiência entretanto adquirida com a concessão da Estalagem de Santa Iria.
Fora disto não há solução viável. Insistir na venda das ruínas sem qualquer projecto aprovado não passa de uma reles maneira ardilosa de continuar a intrujar os tomarenses.
Definir objetivos não reúne dificuldades de monta. O que exige dificuldades acrescidas é elaborar planos para os atingir. É aqui que frequentemente a porca torce o rabo. Por isso costumo dizer que os programas eleitorais são, na maioria dos casos, uma panaceia. Verdade se diga que, hoje, a nível de legislativas os programas dos concorrentes começam a ser mais credíveis, excetuando os apresentados por Passos Coelho do PSD, já se vê.
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