terça-feira, 27 de setembro de 2016

Ficamos bem entregues

Ao regressar do Brasil, em Julho passado, não fazia parte dos meus planos encarar sequer a hipótese de me candidatar nas próximas autárquicas. Todavia, ouvindo os conterrâneos, lendo a imprensa local e constatando a miséria a que isto chegou, comecei a mudar de opinião. De tal forma que, quando um ou outro me encorajava com argumentos lisonjeiros, (naquele jeito tão tomarense de lutar, tipo "avance que pode contar com o meu apoio", mas depois, quando se olha para trás, já não está lá ninguém), comecei apesar disso a pensar com afinco nos meus deveres de cidadania, entre os quais avulta o de eleger e ser eleito, e tendo também em linha de conta que gosto muito desta terra, porém nem tanto assim de alguns dos seus habitantes.
Andava nessa meditação, e quando até já admitira, perante alguns amigos, a hipótese de poder vir a encabeçar uma larga coligação de salvação local, (que é do que isto está mesmo a precisar) englobando no mínimo um dos tradicionais "grandes" (PS, PSD, IpT), eis que surgiu a frase salvadora. O ilustre e honrado cidadão Luís Ferreira proclamou, numa entrevista ao semanário Cidade de Tomar, que os dois eleitores mais qualificados para exercer funções na câmara, são afinal ele próprio e o Luís Boavida. Respirei logo de alívio, ante semelhante e tão boa novidade. Havendo dois conterrâneos mais qualificados do que eu, estava definitivamente dispensado de encabeçar qualquer lista. E portanto de pensar sequer mais nisso. Adeus problemas de consciência! Adeus obrigação cívica! Adeus deveres de cidadania!
Nada disse na altura, posto que Luís Ferreira, nas suas cautelosas palavras, omitiu a argumentação que daria fundamento à sua afirmação. Mais qualificados porquê? Vai daí, tenho andado todo este tempo a suputar. O que me permitiu chegar às conclusões que a seguir exponho, com vossa licença.
Mais qualificados, desde logo porque ambos são de outra geração. Viveram menos, o que lhes permite continuar a ter sonhos e a acalentar ainda esperanças num futuro mais promissor. Ainda têm ilusões. E têm tempo. Muito tempo.
Também não foram, nem um nem outro, até ao doutoramento académico, (apesar do Luís dos frangos ter andado pelos escanhos universitários até ao Dr), o que os dispensa de alguma humildade  perante o saber. Apanágio dos que chegaram ao cume, e aí constataram "Afinal só sei que nada sei."  Outrossim, nunca combateram numa guerra a sério, nem comandaram homens em combate, o que os torna menos exigentes para com os seus subordinados. Mas também menos credíveis. Porque geralmente se acredita mais em quem já deu e continua a dar o peito às balas. Antes em sentido próprio. Agora em sentido figurado.
Tão pouco têm mundo, experiência ou formação aprofundada em Economia política, que lhes faculte perceber, nesta altura do drama local e nacional, que em termos macro-económicos o país e a cidade estão a trilhar a passos largos um caminho errado, que nos leva a todos  para a ruína. Isto quanto ao que não têm, mas os avantaja em relação a mim.
Inversamente, as vantagens pela positiva, são também várias. Usam telemóvel e eu não. Frequentam o facebook e eu não. Fazem selfies e eu não.  Frequentam festas populares e eu não. Gostam de frango de aviário assado e eu não. Bebem vinho e eu não. Bebem cerveja e eu não. Precisam da política e eu não. Ainda ambicionam e podem vir a fazer carreira e eu já não.
Assim, tendo em conta todos os atributos acima enumerados, que não são nada poucos, bem como outros que terei omitido sem querer, que a idade não perdoa, tomei uma decisão. Está doravante totalmente fora de questão que eu encare sequer a possibilidade de me candidatar a candidato. Digo mais: Caso os dois ilustres, honrados e qualificados cidadãos nabantinos venham a encabeçar cada qual a sua lista; ou mesmo se forem os dois na lista PSD (tendo em conta os últimos desenvolvimentos no PS, já faltou mais...) podem ficar descansados que apenas tenciono votar Boavida. Não por opção política. Apenas por realismo. Na minha idade, se resolvesse votar na má vida, não iria longe.
Que fique contudo bem claro que, no meu humilde entendimento, ganhe um ou ganhe o outro, ficamos bem entregues. Ó se ficamos!  Nunca o futuro de Tomar terá sido tão risonho. Só faltará então determinar o tipo de riso. Riso franco? Riso conformado? Riso amarelo? Em qualquer caso, a situação é tão má que rir ainda continua a ser o melhor remédio perante certas coisas.
Mas tenhamos em conta o velho adágio: "Dá tempo ao tempo irmão. O tempo dar-te-à todas as respostas." A seu tempo, claro!

anfrarebelo@gmail.com

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