domingo, 13 de agosto de 2017

Uns sacam outros pagam - 3

Cabe pedir desculpa por insistir pesadamente no grave problema do Aqueduto dos Pegões. Alguém tem de denunciar tal situação, sob pena de tudo continuar na ignorância e no esquecimento, tão confortáveis e convenientes para a tutela do Convento de Cristo.
Foi escrito anteriormente que, além dos Pegões Altos, há mais dois troços do aqueduto filipino com grande interesse histórico e monumental -A Mãe de água ou Casa da água da Porta de Ferro, entre o Casal Novo e os Brazões, e o Tanque da Cadeira d'el-rei. A Mãe de água faz parte do sector mais afastado do aqueduto e por isso mesmo menos conhecido. Já o Tanque da Cadeira d'el-rei está mesmo à mão de semear, ali junto ao Casal de Santo António, logo após o Casal do Láparo. É pouco conhecido porque está escondido pelo muro da Mata dos sete montes e também porque muitos tomarenses não sabem sequer o que é a Cadeira d'el-rei e onde fica.
A cadeira d'el-rei é exactamente aquilo que se vê nesta fotografia:


Trata-se de uma lápide embebida no muro, que indica o local onde esteve a cadeira d'el-rei Filipe II de Portugal, terceiro de Espanha, aquando da inauguração do Aqueduto de abastecimento de água  ao Convento, em 1614.
Porquê precisamente aqui? Porque é o limite entre os terrenos foreiros, pertencentes aos habitantes da comunidade, nos termos dos forais em vigor à época, e a propriedade privativa da sede da Ordem de Cristo, a Cerca dos Frades, resultante da reforma de 1529, que expulsou a população de Santa Maria do Castelo, no interior das muralhas, para a vila baixa, e a do Vale de S. Martinho, onde estão agora os claustros da Hospedaria, de Santa Bárbara e de D. João III, para S. Miguel de Porrais, agora Carregueiros.
A construção do aqueduto filipino resulta dos incómodos sofridos pela corte de Filipe II de Espanha, aquando das cortes de Tomar de 1581. Inicialmente previstas para Lisboa, as referidas cortes realizaram-se em Tomar porque a comitiva espanhola foi avisada de que grassava em Lisboa uma epidemia de peste, o que praticamente a forçou a ficar por aqui. Durante os cerca de seis meses de forçada estada nabantina, foram grandes os padecimentos, pois não havia água corrente no convento mais rico de Portugal, coisa inimaginável já na época, sobretudo porque até no mosteiro de Alcobaça, congregação bem mais pobre, corria um rio na respectiva cozinha.
Uma vez aclamado rei de Portugal, como Filipe I, Filipe II de Espanha ordenou imediatamente que se providenciasse um aqueduto para abastecimento de água ao Convento de Cristo. Terminados os estudos prévios e o respectivo projecto, do italiano Filippo Terzi, logo se iniciaram os trabalhos de construção, em 1593. Vinte anos mais tarde, em 1613, a obra grandiosa estava concluída, vindo a ser inaugurada por Filipe III de Espanha, segundo de Portugal, em 1614, conforme consta da lápide acima reproduzida.
Vale a pena aprofundar um pouco mais esta questão, pois ela pode ajudar a compreender a actual atitude do governo e de muitos tomarenses em relação ao aqueduto. Estas fotos mais detalhadas mostram que o texto da lápide foi intencionalmente picado,de forma  a evitar que se pudesse ler:




Vale-nos na circunstância o cronista português João Baptista Lavanha, que trabalhou para os Filipes. Segundo deixou exarado, a lápide rezava algo como: Filipe I o começou, Filipe II o acabou, o que os braços de tantos reis portugueses não conseguiram fazer. Vai daí, os patrioteiros da época não gostaram mesmo nada, sobretudo porque era verdade, tendo tornado o texto ilegível ainda em 1640, senão mesmo antes e pela calada.
Temos assim que, lá bem no fundo de cada um de nós, o aqueduto continua a ser uma obra espanhola feita por um italiano, logo maldita para todos os efeitos. Aceitou-se e protegeu-se relativamente enquanto fazia falta, por não haver outro remédio. Agora que há em toda aquela zona água da rede com fartura, mesmo se demasiado cara, que se lixe o Aqueduto dos Pegões!
Trata-se, no entender de Tomar a dianteira, de uma visão tacanha das coisas, conforme se tentará demonstrar nos próximos capítulos.

1 comentário:

  1. E à passagen do cortejo fúnebre do balhelhas D. Henrique, em 1580, o povo chasqueava gritando:
    "Viva el-rei D. Henrique
    no inferno muitos anos."
    que deixou em testamento
    Portugal aos castelhanos."

    Assim como assim, não é correto deixar este monumento ao abandono. Pelo menos para recordar a corja de traidores e vendidos da época. Até o poeta Diogo Bernardes, a quem faltava "régia casa pão e pano" dedicou um poema ao traidor Cristóvão de Moura:
    ....
    "fartai-me, cantarei suavemente,
    banhado no licor da clara fonte
    o que agora a fome não consente,
    ou seja em baixo vale ou seja em monte,
    em rio, em campo, em casa ou em floresta,
    sempre acharei de vós que cante e conte"
    (o Cristóvão concedeu-lhe uma tensa anual de quarenta mil reis)

    Bem recentemente, vimos elites portuguesas a perorar, cá dentro e lá fora, pela intervenção estrangeira em Portugal, a governar com seu programa (indo ainda mais longe), violentado o povo de toda a maneira e feitio.
    Compreende-se, assim, aqueles "patrioteiros" que destruíram as inscrições.

    Santa Geringonça! Democrática e patriótica. Portugal Sempre!


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