Uma história nabantina dos anos da penúria
Em Tomar, no final da década de 40 do século passado, o hospital era na Rua da Graça e o mercado semanal realizava-se aos sábados, onde está agora o ParqT e na Praça da República. Havia então muita tropa, com o Regimento de Infantaria 15 aquartelado no Convento de S. Francisco, o Quartel General, ali no Palácio Alvaiázere e o Hospital Militar, lá em cima no Convento de Cristo. Com tanto militar mais os varões civis, vivia relativamente bem a dúzia e meia de profissionais do bordel local, situado na Rua de Pedro Dias, Rua da Saudade para os tomarenses, desde o seu encerramento compulsivo e definitivo no final de 1961
Coincidindo com o mercado semanal, as ditas meretrizes vinham ao hospital para a obrigatória "revista médica", como então se dizia. Formavam fila à porta, aguardando a sua vez, mas depois era rápido, pois reinava a confiança. O médico de serviço já as conhecia, pelo que em geral se limitava a perguntar a cada uma se havia algum problema. Se a resposta fosse negativa, que era a regra geral, mandava carimbar a caderneta e passava à seguinte.
Num desses sábados, uma velhota dos arredores vinha da estação de caminho de ferro e ia para o mercado semanal. Ao passar junto ao hospital, reparou naquela fila de mulheres. Dado que a guerra terminara em 1945, mas ainda continuava a haver racionamento de produtos alimentares, a referida aldeã julgou que estavam ali a vender algum produto de contrabando, coisa habitual na cidade de então.
Vai daí, aproximou-se e perguntou a uma das da fila o que estavam ali a vender. -Estão a dar caramelos, foi a resposta pronta, com ar galhofeiro. Interessada, a velhota tomou a sua vez na fila, ficando naturalmente em último lugar. Atendidas todas as outras mulheres, o médico como não a conhecia exclamou: -Então tu, com essa idade e toda desdentada, não tens vergonha de ainda andar nesta vida? Aí a anciã respondeu prontamente, com aquele aprumo próprio de quem está cheio de razão: -Saiba o senhor doutor que já não os trinco. Mas ainda os chupo!
Os caramelos que estavam ali a dar, bem entendido...
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