sábado, 17 de dezembro de 2016

A verdadeira causa

Já aqui foi dito anteriormente, mas será melhor repetir. O turismo estrangeiro aumentou consideravelmente em Portugal, o que é excelente. Convém contudo ter em conta que governo e autarquias pouco ou nada têm a ver com esse feliz incremento. Na verdade, essa bem-vinda invasão resulta quase exclusivamente de factores externos. Sobretudo do clima de insegurança que se instalou em vários grandes destinos tradicionais  do turismo industrial moderno. Eis aqui um exemplo flagrante:
Le Monde, Économie et Entreprise, 15/12/2016, página 4

Pois é. Diz o título da notícia que "Devido à deserção dos turistas estrangeiros, o crescimento económico da Turquia empanou. Os múltiplos atentados e o falhado golpe de estado de 15 de Julho levaram a melhor sobre a confiança dos investidores."

"Atingidos em cheio pela acentuada redução do fluxo de turistas estrangeiros, a diminuição do crescimento económico e a queda la libra turca em relação às divisas fortes, os hoteleiros turcos estão totalmente desmoralizados. "Oficialmente, houve este ano uma redução de 37% nas entradas de visitantes estrangeiros, em relação a 2015, mas a realidade é bem mais grave", assevera Yasar Yavus, dirigente da Associação de turismo de Sultanahmet, a península histórica de Istambul.
Comerciantes do Grande bazar, restaurantes, guias turísticos e vendedores ambulantes já não sabem o que fazer à vida. Os hoteleiros do bairro estão igualmente inquietos. "Cerca de 800 têm grandes dificuldades, 400 estão praticamente em pré-insolvência, enquanto os restantes procuram tanto quanto possível manter a cabeça fora da água", acrescenta o mesmo dirigente. 
Já se perdeu a conta aos estabelecimento encerrados temporariamente, com a esperança de poderem vir a reabrir na primavera de 2017. "Estamos a oferecer agora a 30 euros por noite, quartos que antes se alugavam por 100 euros. Como é que quer que a gente se possa safar?!", exclama Yasar Yavus, também proprietário de um hotel de média categoria no bairro de Sultanahmet.
Nas ruas do dito bairro, batidas por um vento glacial, os únicos turistas visíveis são famílias vindas do Golfo pérsico ou da Arábia Saudita, mais raramente da Rússia, país com o qual as relações diplomáticas melhoraram muito nos últimos tempos. "Mas os turistas árabes e russos não compensam os nossos prejuízos. Aqui no bairro, a clientela tradicional era composta por 90% de ocidentais (alemães, ingleses, franceses, americanos), todos virados para a história e para os monumentos. Os russos e os árabes não apreciam o coração histórico de Istambul. Preferem os centros comerciais", conclui Yasar Yavuz.


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As recentes medidas governamentais de apoio às PMEs ligadas ao turismo, anunciadas no passado dia 8 pelo primeiro-ministro Binali Yildirim, não impressionaram minimamente o já citado dirigente e hoteleiro: "Não precisamos da ajuda do governo. Só queremos segurança e estabilidade. Mais nada." (Ler Nota do tradutor, no final)
Foi no coração de Sultanahmet, entre a Basílica de Santa Sofia (ver foto) e a Mesquita Azul, que ocorreu, em 12 de Janeiro, o primeiro atentado-suicida contra turistas estrangeiros. Atribuído ao autoproclamado Estado islâmico, provocou a morte de dez turistas, quase todos alemães. Desde então, os ataques terroristas contra turistas têm continuado (4 mortos na Avenida Istiklal, a 19 de Março, 45 mortos no aeroporto Ataturk, em 28 de Junho), atingindo fortemente um sector económico que é uma fonte importante de empregos e de receitas em divisas convertíveis."
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Marie Jégo, correspondente do Le Monde em Istambul
Tradução e adaptação de António Rebelo

Nota do tradutor

A atitude do senhor Yavus, industrial hoteleiro, ao declarar que não precisam da ajuda governamental, mas apenas de segurança e de estabilidade, é pouco usual nos países muçulmanos e mesmo nos países do sul da Europa. Para não irmos mais longe, em Portugal é o que todos sabemos. Quase todos os cidadãos dependem, directa ou indirectamente, de subsídios, ajudas, comparticipações, patrocínios ou empregos públicos. O que parece convir a ambas as partes. Aos beneficiados por requerer muito menos esforço. Aos governantes porque garante confortáveis votações previamente compradas. Lá diz o nosso povo, munido da sua milenar sabedoria: "O eleitor e o cão olham primeiro prá mão."

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