sábado, 27 de março de 2021

  





Obras municipais em função de Bruxelas


POLÍTICA EM SENTIDO CONTRÁRIO

António Rebelo

Os que me são próximos fazem o favor de considerar que não sou inteiramente desprovido em termos de massa cinzenta, vulgo inteligência. Apesar disso, confesso ter por vezes alguma dificuldade em compreender certas situações. Uma delas era a das listas partidárias resistindo, eleição após eleição, a apresentar programas eleitorais, ou planos dignos desse nome, como se houvesse um obstáculo intransponível.
Com a  intervenção da srª presidente Anabela Freitas no recente webinar sobre o Nabão, no qual brilhou, fez-se luz na minha cabeça. Disse a senhora que o fabuloso plano dos 22 milhões de euros para a despoluição da bacia do Nabão não vai ser contemplado na bazuca europeia, porque nela não tem cabimentação possível. Esse programa europeu contempla situações de falta de água e não de poluição, acrescentou a autarca.
Sem a bazuca europeia, a srª presidente nabantina esclareceu, com grande à vontade, que havia outras armas também europeias, designadamente o próximo quadro comunitário de apoio, a transferência de verbas não executadas, que é como quem diz sobrantes, ou ainda o programa europeu REACT-EU, destinado a complementar financiamentos na recuperação pós pandemia.
Foi este alarde de conhecimentos práticos sobre recursos europeus, por parte da nossa presidente, que me abriu finalmente o bestunto. Pelo menos no caso de Tomar, mas creio que a situação é geral. A autarquia não tem planos para nada, porque aguarda os programas europeus e só depois manda fazer projectos que neles encaixem.
Ou seja, enquanto Bruxelas vai elaborando e financiando programas destinados a viabilizar projectos nos diferentes países, as autarquias vão aguardando esses programas para neles enfiarem projectos feitos à medida, em função dos ditos. É a política ao contrário. Ou às avessas. 
No caso da poluição do Nabão, a Tejo ambiente e/ou a câmara de Ourém decidiram proceder by the book, apresentando os projectos e só depois solicitando o financiamento, e lixaram-se. Não há programa compatível, assim à primeira vista. Embora um bom especialista encontre sempre uma solução para o problema.
Não vem daí grande mal ao mundo, dirão os acomodados tomarenses do costume. Ai vem vem! Estão outra vez redondamente enganados. Desta vez duplamente enganados. Por um lado, porque podem muito bem nunca aparecer programas que contemplem as necessidades específicas de Tomar, nomeadamente na área do turismo. Por manifesto desconhecimento de Bruxelas, uma vez que não existem planos locais nessa área, para além da pequena hotelaria.
Por outro lado, esse  oportunismo de sacar dinheiros de Bruxelas provoca situações em que, bem vistas as coisas, uma obra esconde afinal outra obra mais importante. Pense-se, por exemplo, nas obras já feitas na Várzea grande e na Av Nun'Álvares, bem como nas previstas para  a Estrada da Serra ou Cem soldos.
Em todos esses casos, obras nitidamente ornamentais, cuja utilidade prática está por demonstrar, escondem afinal aquilo que se pretendia desde o início: a renovação das redes de iluminação, de água e de saneamento. Um maná para a Tejo Ambiente, por exemplo, que assim evita  financiar as redes de distribuição daquilo que vende aos consumidores forçados. 
Convém insistir, para memória futura. É a política às avessas, ou ao contrário. Haja paciência!

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