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Autarquia e informação local
Começa a aparecer uma síndrome de Tomar?
António Rebelo
Já todos lemos ou ouvimos falar sobre síndromes. São mazelas cerebrais, na sua maioria passageiras, provocadas por situações extremas. Há as mais variadas. Da Síndrome de Estocolmo à Síndrome de pânico, passando pela Síndrome de Jerusalém.
Esta última, que atingia anualmente, antes da pandemia, uma média de 500 turistas, caracteriza-se por ideias delirantes, psicose religiosa intensa e crença de que são profetas ou messias. Felizmente, segundo os especialistas, tende a desaparecer logo que o visitante abandona a cidade santa.
Serve este intróito para mostrar os contornos de um estranho fenómeno nabantino, que venho detectando à distância. Reza o ditado popular que "Ao longe vê-se melhor a horta."
Conforme bem sabemos, a vida não está fácil em lado algum, muito menos no vale do Nabão, com a população a desandar e o concelho e definhar. Daí situações de stress, de burnout, potenciando talvez o surgimento de uma síndrome de Tomar.
Será que, confrontados com uma situação local longe de ser confortável, alguns residentes entraram em sobreaquecimento e começaram a delirar, confundindo os seus desejos com a realidade, ou profetizando coisas ilusórias?
Quem continuar a leitura julgará.
Animado por um título jornalístico que considerava esclarecedor e inequívoco, como sempre deve ser a prosa noticiosa, resolvi ler o texto. O título era "Câmara entrega exploração do quiosque da Várzea grande". Disse então para comigo que afinal tiveram sorte. Encontraram um interessado, o que não era nada fácil.
Terminada a leitura, desencantei. Não era nada disso. A câmara ainda não entregou a exploração do quiosque.. Limitou-se a anunciar a próxima abertura do indispensável concurso público. Trata-se, por conseguinte, de uma evidente confusão entre desejo e realidade, por parte de quem redigiu o comunicado da autarquia. Uma frase assim, com verbo no presente do indicativo, remete para o passado, quando é lida pelos destinatários. Por causa do tempo entretanto decorrido, da escrita pelo emissor até à leitura pelo receptor. Donde o meu equívoco inicial.
Mais curiosa ainda é a posição da autarquia, ou de quem redige o seu material informativo e de propaganda. No corpo da notícia, consta este excerto muito profético: "O espaço pretende contribuir para a dinamização daquele espaço que ganhará novas apetências por parte de munícipes e turistas."
Temos assim, antes de mais, o que parece ser um lapso vocabular. A primeira palavra "espaço" devia ser certamente "quiosque", ou equivalente, para não colidir com a outra "espaço", logo mais adiante. Além de que parece bem difícil para os leigos, que somos todos, dependendo do assunto, entender que um espaço possa dinamizar outro espaço, assim sem mais detalhes.
Segue-se o mais grave, porquanto muito semelhante a um outro dos sintomas da antes citada síndrome de Jerusalém. O autor do texto noticioso armou-se em profeta, garantindo coisas que estão por demonstrar. Quem pode afiançar nesta altura que o terreno da antiga messe, com ou sem quiosque e esplanada, ou mesmo a Várzea grande remodelada, "ganhará novas apetências por parte de munícipes e turistas"? Foram feitos inquéritos sociológicos a esse propósito junto dos residentes e dos turistas? Quais foram os resultados? Confundiram a opinião de meia dúzia de eleitos e funcionários interessados na coisa, com a opinião pública?
Concluindo, se ainda não se pode afirmar com segurança que há uma sindrome de Tomar, convenhamos que são cada vez mais e mais convergentes os indícios nesse sentido. Para não ir mais longe, no texto anterior, sobre estratégia municipal de habitação, são detectáveis evidentes episódios proféticos. Como aquele anúncio da requalificação do ex-Convento de Santa Iria, por exemplo, velho de mais de 20 anos. E que continua a ser uma profecia.
Para os mais interessados nestas questões nabantinas, eis o link da notícia original:
ADENDA
Sem de modo algum pretender azarar a iniciativa camarária do quiosque, entendo ser minha obrigação de cidadania fazer uma pergunta simples: Se o quiosque do Mouchão nunca funcionou, o da Várzea pequena não resultou, e o outro na avenida junto ao mercado pouco durou, em que se basearam para profetizar que o da Várzea grande será um êxito?
Informação de origem divina, talvez. A tal síndrome...
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