Ser comentador em Portugal, sobretudo na província e particularmente em Tomar, não é tarefa fácil, nem cómoda, nem gratificante. Antes pelo contrário. É-se em muitos casos incompreendido e fica-se mal visto sempre que não se acompanha a voz do dono, neste caso da dona, e/ou da maioria.
Tudo porque, particularmente desde o início da geringonça, se vem tornando cada vez mais evidente que os governantes instalados procedem de forma a favorecer os seus eleitores ou, em sentido mais amplo, os funcionários e outros dependentes da administração pública nacional, regional e local, em detrimento dos cidadãos do sector privado.
Desse estado de coisas resulta uma óbvia divisão de pontos de vista. Há de um lado os que vivem graças aos impostos, e do outro os que pagam esses impostos. Mas os funcionários públicos também pagam impostos, dirão. Lá pagar, pagam. Porém, na realidade, o patrão limita-se a pagar-lhes menos que o vencimento nominal bruto, retendo a diferença sob a designação de IRS. Não é como no sector privado, onde os patrões têm de conseguir lucros para comprar matéria prima, amortizar o investimento, manutencionar os meios de produção, pagar aos seus trabalhadores, bem como para, além de tudo isso, liquidar contribuições e impostos.
Estamos portanto perante duas situações bem diferentes. De um lado, o conjunto da administração pública, que não tem que se preocupar com lucros, nem com racionalidade económica, nem com satisfação dos clientes, a não ser tendo em vista o voto. Do outro, um universo de empresários que não depende de clientes cativos, nem de receitas garantidas. Tem forçosamente de gerar valor acrescentado. Tem de conquistar clientes e de proceder depois de forma a mantê-los.
Não surpreende por isso, num país assim dividido em dois universos praticamente antagónicos, que os comentadores sejam mal vistos, quando não maltratados. Os funcionários e outros dependentes do actual sistema foram demonstrando ao longo dos anos uma mentalidade avessa ao equilíbrio de posições. Não entendem, ou simulam não entender, que há sempre uma dualidade de pontos de vista entre o comentador franco e o funcionário ou dependente do Estado. Aquele vê as coisas de fora para dentro, como a generalidade dos que não são funcionários. Estes, pelo contrário, vêem as coisas de dentro para fora.
Um exemplo recente, permite perceber melhor esta questão. Parece que não caiu bem em todas as mentes a expressão "em 2013, a situação dos SMAS já era calamitosa", inserida no texto anterior. Houve quem discordasse por escrito, (o que se agradece por ser raro e, sobretudo, pelo tom extremamente correcto e amistoso, a demonstrar que se entendeu que em democracia as divergências são normais, não implicando inimizades), sustentando que os documentos internos disponíveis demonstram o contrário. Será certamente verdade, não se duvida. Mas esse é apenas o tal ponto de vista "de dentro para fora". Acontece que Tomar a dianteira adoptou, e adopta sempre que possível, o ponto de vista oposto, "de fora para dentro". Que interessa aos consumidores que, de acordo com aquilo que mostram os documentos oficiais obrigatórios, a situação dos SMAS seja razoável, boa ou excelente, se os preços são nitidamente abusivos, predadores mesmo, quando comparados com os concelhos vizinhos? Que coerência, justificação ou prioridade têm as ampliações da rede de distribuição dos SMAS, quando há sectores, nomeadamente no centro histórico, a 50 metros dos Paços do concelho, com rede podre, condutas prejudiciais para a saúde pública, e esgotos de colector único? Porque pagamos uma "taxa de resíduos sólidos", que não existe nos outros concelhos? Lá não recolhem o lixo? O que está primeiro afinal, a situação dos SMAS, ou a satisfação dos consumidores forçados?
Para os funcionários da autarquia, sobretudo dos SMAS, é óbvio que tudo vai e irá bem, no melhor dos mundos possíveis, não sendo jamais a situação calamitosa, enquanto forem recebendo pontualmente os respectivos vencimentos. Outra é porém a posição dos consumidores forçados, que somos afinal todos. Entende-se que a situação dos SMAS é calamitosa e necessita de reformas profundas e urgentes, porque o tarifário não pode continuar a aumentar sempre que convém aos ocasionais detentores do mando, devido aos evidentes prejuízos que causa ao desejado desenvolvimento da comunidade concelhia. Não será decerto por prazer ou mero acaso que tomarenses continuam a fazer as malas, mas antes porque ninguém gosta que lhe metam a mão ao bolso para além do razoável.
É este o ponto de vista de Tomar a dianteira, de fora para dentro, fundado nos factos que são do domínio público.
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