terça-feira, 8 de agosto de 2017

República das bananas e reisinhos locais

Uma das principais características das chamadas Repúblicas da bananas, aqueles países geralmente com regimes mal eleitos onde quem manda de facto são as grandes empresas produtoras de fruta, ou de qualquer outra coisa, é o facto de nas fronteiras e fora da capital o poder ser exercido não por representantes eleitos do povo, mas por reisinhos locais. Sem qualquer legitimidade, porque sem mandato popular, esses tiranetes rurais abusam das circunstâncias para se transformarem em senhores absolutos no seu domínio. Fazem-no geralmente por uma de duas razões, que nalguns casos até podem estar estreitamente ligadas: A - Demonstrar poder, para impressionar a população; B - Criar dificuldades, para posteriormente negociarem facilidades.
As democracias do tipo ocidental são os regimes que mais garantias oferecem contra tais tiranetes aprendizes de ditador. Sucede contudo que, nos países onde esse tipo de governo não foi conquistado pela população, mas oferecido de bandeja por determinado grupo social, os cidadãos tendem a não se incomodar com manifestações graves contra o efectivo governo das coisas do povo por representantes eleitos por esse mesmo povo.
É o caso em Portugal, cuja democracia de tipo europeu nos foi oferecida pelos militares há 43 anos. Devido a essa circunstância fundamental, subsistem por esse país fora, sobretudo naquelas terras que sempre foram fortemente favoráveis ao salazarismo, muitos reisinhos domésticos, tolerados pelos cidadãos e pelo poder local, apesar de ridículos, perigosos e fortemente incomodativos porque atrevidos e mal educados em termos cívicos e políticos.
Tomar não escapa à regra. Importante centro militar no tempo do Estado novo, aqui se sucedem de tempos a tempos cenas caricatas, (para não dizer algo mais duro), perante as quais os eleitos abdicam da sua autoridade, assim permitindo que as coisas se vão agravando, em vez de melhorarem. como seria curial numa democracia autêntica.
"Equipa do Canal História proibida de filmar no Convento de Cristo e nas igrejas", noticia Tomar na rede. A notícia não explica porquê, decerto por falta de informação, o que também é típico. Regra geral, os reisinhos  julgam-se com plenos poderes, entre os quais o de não dar cavaco à população.


Neste caso, a directora do Convento de Cristo, uma chefe de divisão da DGPC, sobre a qual os tomarenses nunca foram chamados a pronunciar-se, resolveu proibir uma equipa profissional de fazer o seu trabalho. Se calhar só até que posteriores negociações conduzam ao desbloquear da situação.
Pela mesma ocasião, o vigário forâneo da paróquia, que nem os próprios fiéis alguma vez sufragaram, interditou filmagens no interior da igreja de Santa Maria dos Olivais, propriedade do Estado e antigo património da Ordem dos Templários. Trata-se de um claro abuso de autoridade, pois a igreja não é proprietária daquele templo, nem tem competência para autorizar ou proibir o que quer que seja no seu interior, desde que salvaguardadas as condições de respeito pelo lugar, nos termos da Concordata assinada pela igreja católica, que lhe permite usar gratuitamente as igrejas pertença do Estado, mas não geri-las.
É sabido que o referido ministro do culto já anteriormente abusou de forma reiterada das suas funções, exorbitando largamente as suas competências, nomeadamente ao autorizar a transferência para o museu há pouco anos criado pela diocese em Santarém, de património da igreja de S. João, pertença do Estado. Apesar de tal assunto ter gerado alguma polémica, nunca até hoje foi resolvido de forma satisfatória, por manifesta condescendência dos fiéis. A tal carência de hábitos democráticos, que fazem sempre muita falta.
Ignora-se o que terá a equipa televisiva do canal História podido filmar. Mas sabe-se que os tomarenses e os eleitos locais já ficaram outra vez mal na fotografia, por consentirem desmandos intoleráveis num país da União Europeia. Mas como estamos a dois meses das eleições, o silêncio é de oiro.
Que raio de povo tão estranho!

Actualização

De acordo com informações posteriores, prestadas por João Fiandeiro, o guia local do grupo das filmagens, entretanto o pároco de Tomar reconsiderou, tendo autorizado filmagens no interior da Igreja de Santa Maria dos Olivais, Panteão templário. É uma decisão que aqui se saúda com alegria, pois reabilita em termos cívicos quem teve a coragem de mudar de opinião. Devia acontecer sempre assim.

3 comentários:

  1. Em junho de 2016 foi editado em Portugal um excelente livro da autoria do Canal História (380 pp), "Templários - da origem das cruzadas ao declínio dos monges guerreiros", um dos melhores livros que li sobre os Cavaleiros de Cristo, onde é realçado o seu papel na fundação do nosso país, o grão-mestre Gualdim Pais, " a importância de Tomar na organização do Templo", as inovações no "famoso castelo templário de Tomar", como "a mudança da localização da torre de menagem, a utilização do alambor [tão debatido neste blogue] e a do hurstício".
    Só por isto merecia o Canal História melhor acolhimento.

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    1. Concordo plenamente, mas como diz o Rebelo, e com razão, os reizinhos locais querem dificultar as coisas para depois dizerem, sim isso foi feito, mas passou por mim, pobre terra, pobre gente........

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  2. CORREÇÃO: onde de lê "hurstício"
    deve ler-se HURDÍCIO: Grade de madeira, com que se resguardavam algumas muralhas, para não serem muito danificadas por aríetes e projécteis.

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